quinta-feira, 6 de junho de 2013

A Rússia e a Europa estão cada vez mais afastadas : Voz da Rússia

A Rússia e a Europa estão cada vez mais afastadas

A imprensa internacional escreve sobre as esperanças não concretizadas, que foram depositadas no caráter inovador da cúpula União Europeia – Rússia em Ekaterinburgo, cidade-candidata à organização da Expo 2020. A tonalidade dos comentários é cada vez mais pessimista: muitas circunstâncias objetivas e subjetivas contribuem para o afastamento recíproco das partes.

 Os principais personagens do encontro em Ekaterinburgo – o presidente da Rússia, Vladimir Putin, o presidente da União Europeia, Herman Van Rompuy, e o dirigente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso – trocaram declarações da disposição de cooperar. Nas palavras do chefe de Estado da Rússia, as partes entendem a necessidade de concluir o mais rapidamente possível a elaboração de um novo acordo básico de parceria estratégica entre a Rússia e a UE.
 Os objetivos estratégicos são compreensíveis, mas na tática surgem problemas. Entre a Rússia e Europa há muitas questões que formam uma cortina de desentendimento, por exemplo, a problemática síria. Tanto a Europa como a Rússia concordam que a crise deve ser resolvida por meios políticos. Mas, na realidade, as posições das partes são muito diferentes: os europeus veem a regularização política como desmontagem do regime de Assad pela força, inclusive com a ajuda de armas fornecidas aos rebeldes sírios. A Rússia, por seu lado, considera que a regularização política subentenda, em primeiro lugar, eleições democráticas com a renúncia recíproca ao uso de armas. É evidente que essas duas conceções coincidem apenas no plano das declarações. É possível buscar aqui compromissos durante muito tempo sem grandes esperanças de alcançar êxito.
 A abolição do regime de vistos é um outro exemplo. À primeira vista, os adeptos da integração europeia partilham a opinião de Moscou de que este anacronismo impede de fato o desenvolvimento de contatos humanitários e empresariais. Mas o avanço é também barrado, em particular, pela exigência do Ministério dos Transportes da Rússia de apresentar dados sobre passageiros aéreos que chegam à Rússia vindos dos países da UE ou passam em trânsito pelo nosso país. Bruxelas recusa-se categoricamente a fazê-lo, apesar de uma exigência análoga dos Estados Unidos ter sido satisfeita em tempos sem grandes problemas. Possivelmente, poder-se-á alcançar um compromisso neste plano de qualquer maneira, mas, para encontra-lo, é necessário algum tempo.
 O exemplo mais patente são os chamados valores europeus, assentes em normas ético-morais superliberais, as quais, frequentemente, a própria sociedade europeia não está disposta a aceitar. Trata-se, em particular, de casamentos homossexuais e de uma série de problemas ligados à concessão de oportunidades iguais. A Europa considera que estes valores não têm alternativa e devam ser respeitados universalmente, ideia com a qual a Rússia, naturalmente, não concorda.
 A Europa qualifica a posição da Rússia como arcaica. É muito provável que seja assim. A sociedade russa professa valores tradicionais e não se pode fazer nada com isso (se for necessário fazer algo). Destaque-se que a opinião pública europeia ainda se dá conta da necessidade de manter sua própria identidade. Mas, por mais estranho que pareça, a elite política europeia está privada de sentimento de conservação, demonstrando apego ao libertarismo. Como se considera oficialmente, é nomeadamente este fator que levou a Europa à vanguarda do desenvolvimento socioeconómico e lhe garante um futuro brilhante. De que forma esta afirmação corresponde à realidade, podemos julgar pelo aumento das crises interétnicas, interconfessionais e interculturais locais, que destroem bases da civilização europeia.
 Olhando para a situação de fora, a Rússia não se apressa a renunciar aos princípios tradicionais. A Europa, em resposta, mostra descontentamento, não acostumada a reconhecer sua posição errada. Por outras palavras, assiste-se mais uma vez ao desentendimento mútuo, que com cada dia cresce como uma bola de neve. Não está muito claro o que se pode fazer nesta situação. Eis a opinião do redator-chefe da edição analítico-informativa Geopolítica, Leonid Savin:
 “Com certeza, não devemos imitar os valores europeus, mesmo recordando as palavras de Pedro I: “É necessário abrir uma janela para a Europa, para estender os canhões”. O czar tinha em vista adotar algumas tecnologias, necessárias para sobrevivência do país. Hoje, as tentativas de interagir com os países da União Europeia visam obter certas tecnologias, mas não adotar os valores europeus.
 Por outro lado, a Europa deve aprender com a Rússia em vários aspetos, por exemplo, no que diz respeito à tolerância. Nos tempos da divulgação do Cristianismo, a Europa massacrou toda sua população pagã. Foram exterminados pelo menos os povos da tradição pagã, que existiam ali durante séculos. Mas na Rússia ainda é possível encontrar tradições que nunca chegaram a desaparecer. Nossa tradição ortodoxa existiu lado a lado com o Islã, o Judaísmo, o Budismo. Por isso, na área das relações de tolerância, a Rússia pode ainda ensinar a Europa”.
 Entretanto, há também um ponto de vista diferente. Seus adeptos consideram que as relações entre a Rússia e Europa não são um jogo da corda ou um jogo em que a derrota de um participante equivale automaticamente à vitória de outro. Este é um processo de enriquecimento recíproco, ao mesmo tempo que na realidade os valores básicos russos e europeus são iguais.
 Fala o professor da Universidade de Amizade de Povos, Maxim Kiselev:
 “É triste ver que as divergências crescem. Penso que não deve haver tais valores que sejam exclusivos de um grupo étnico ou de um país – valores da Rússia, valores da América, valores da Europa. Seria mais justo falar sobre os valores comuns da Humanidade. Referindo-se à situação concreta em torno do afastamento da Europa em relação aos valores da família (tenho em vista casamentos homossexuais), não considero que a Rússia deva fazer o mesmo ao nível legislativo. Mas será possível reagir com compreensão à posição europeia. A meu ver, no mundo de hoje, seria mais justo não censurar uma opinião diferente do nosso ponto de vista”.
 Possivelmente, fará sentido tirar os óculos de cor-de-rosa ou faixas negras, para olhar uns para os outros imparcialmente. Talvez tal não seja suficiente para ganhar amor recíproco, mas chegará para que a tranca no olho alheio se transforme num argueiro sem importância.

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