sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Catolicismo está retirando-se da Europa: Voz da Rússia

14.02.2013, 15:23, hora de Moscou
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EPA

Igreja Catôlica, Religião, Vaticano, o Papa, crise Oficiando sua última missa, o Papa Bento XVI exortou os católicos a se lembrarem de que uma fé sem obras é como uma árvore sem frutos. Talvez esta seja uma "voz do que clama no deserto", consideram vários peritos em assuntos de religião que vêem de tal maneira o futuro laico da Europa "pós-cristã".

A renúncia de Bento XVI veio de surpresa não só para os fiéis e a cúria, mas também para os especialistas. O próprio Papa explicou, passo por problemas de saúde. Os especialistas, porém, estão dissertando sobre uma crise da Igreja Católica. Inicialmente, muitos viram na figura de Bento uma pessoa que, ao menos, detivesse a crescente secularização da Europa. Como podemos ver, não o aconteceu: os oito anos passados não foram marcados por um retorno de europeus ao seio da Igreja Católica.
Ao contrário, sucedeu que Bento XVI tem sido muito menos popular do que seu antecessor, João Paulo II, a quem acusavam, justamente, de flertar com os valores liberais. A maioria europeia, ao que parece, não chegou a ouvir o teólogo conservador alemão. E ele, por outro lado, não conseguiu, aparentemente, encontrar palavras apropriadas para ser ouvido. Em resumidas contas, a abdicação de Bento pôs de manifesto a crise do catolicismo europeu. Até tal grau que o Cardeal Kurt Koch, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, fez uma declaração muito corajosa de que o futuro da Igreja Católica não está na Europa. Se ele tiver que escolher entre um europeu e um não-europeu, desde que os dois sejam igualmente dignos da sede de São Pedro, ele – disse o Cardeal – escolheria próximo papa um representante da África ou da América Latina.
Yuri Tabak, estudioso das religiões e tradutor, acredita que isto é um mero tibuto ao que se chama de normas politicamente corretas:
"Lidamos com a observância de certas normas novas que já se tornaram habituais no mundo atual. A escolha não será eurocentrista. A escolha será feita tal qual a Igreja o necessitar. A crise existe, isso é incontestável. Ao longo dos últimos anos, a Igreja anda estremecida por escândalos de pedofilia. Além disso, o tema de contraceptivos que está em contradição direta com as questões de luta contra a propagação da SIDA. É impossível apoiar a proibição dos contraceptivos e cuidar, ao mesmo tempo, da saúde de milhões de católicos, em particular, os africanos. E, para além de tudo isso, o problema de celibato sacerdotal. Muitos prelados exigem a abolição dessa proibição medieval. Existe mesmo uma associação que congrega mais de 80 mil antigos padres que são casados e reivindicam reformas eclesiásticas. As atitudes de protesto são muito fortes também na Alemanha, país natal de Bento XVI. Os bispos alemães são uns dos mais liberais no mundo católico. E o próprio Papa, embora indiretamente, está sendo acusado de vários pecados".
A eventualidade de um candidato de pele negra pode ascender à sede vacante já foi debatida antes, ainda no último conclave, em 2005, e nisso não há nada de extraordinário, pois é, mais bem, um reflexo das tendências objetivas dentro da Igreja Católica Romana. O caráter laico da maioria dos países onde o catolicismo é professado, lança novos desafios à Igreja Católica. O Papa Bento, consciente de não ser capaz, por causas objetivas, de lidar ele só com esses problemas, talvez por essa mesma razão decidiu ceder o direito de o fazer a seu futuro sucessor, considera Yuri Tabak:
"A Igreja, enquanto instituição religiosa, encara um problema comum e geral. Isso é justo para todas as confissões. Em sua essência, a Igreja está destinada a proteger certos valores conservadores, salvaguardar a continuidade com o passado. Por um lado, a igreja não deve "apressar-se" no intuito de andar de mãos dadas com a vida da sociedade. Ela deve guardar intactas e levar como legado precioso certas normas éticas tradicionais e tudo aquilo que houve de melhor no passado. Ao mesmo tempo, a igreja não deve transformar-se num gueto, onde os valores se "mumificam", tornando-se falsas relíquias. E, à par disso, ela deve andar à cabeça da sociedade, conduzi-la e ensinar. No presente momento, podemos reconhecer que a igreja, ao menos a Católica, não é muito bem sucedida nesta missão".
Sob essa ótica, a renúncia de Bento XVI é vista por vários analistas como um bom indício. Trata-se de uma mudança radical e epocal, que terá enorme repercussão psicológica nos fiéis. O reverendo Igor Kovalevsky, secretário-geral da Conferência dos Bispos Católicos da Rússia, compartilhou sua opinião com a Voz da Rússia:
"A hipótese de o futuro da Igreja Católica não ficar na Europa, está vinculada, sobretudo, à situação demográfica do mundo, ao número de católicos. Realmente, hoje em dia a maioria dos católicos – assim como a maioria da população do mundo – não vivem na Europa. Em segundo termo, a crise da igreja em si não tem conotação exclusivamente negativa. Qualquer crise traz oportunidade para reconsiderar a situação e encerra possibilidade de mudanças. Qualquer crise sempre tem certos efeitos benéficos para o desenvolvimento da civilização".
A maioria dos analistas coincidem em que a Igreja Católica precisa de um líder que combine a experiência pastoral com a administrativa. Mas também não é o mais importante. É mais importante ainda que um novo papa seja relativamente jovem e tenha um carisma que lhe ganhe simpatias do vasto público. Se essas condições forem satisfeitas, a nacionalidade e a cidadania permanecerão não mais que um assunto privado, enquanto o cristianismo obterá chance para uma nova vida na Europa.
 

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