quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A Função social do Plano Director - Cláudio Ramos Fortuna



Luanda - Na semana passada, ouvimos com muita atenção, à notícia que dava-nos conta do um acordo que o governo provincial de Luanda, assinou com uma instituição chinesa, cujo fito é o de enviar para China alguns técnicos para aprenderem algumas técnicas suponho que mais arejadas sobre os planos directores. E pelo que foi noticiado, estes técnicos hão de trabalhar nos Municípios de Belas e do Kilamba, bem haja a iniciativa! Sobretudo por sabermos que a China tem uma boa universidade de urbanismo, a Universidade de Tonchi, que foi a instituição que “procriou” a centralidade do Kilamba, a tal menina dos olhos vendados do executivo angolano.

Fonte: Club-k.net
Outra nota que despertou à nossa atenção, tem a ver com o facto de o vice governador de Luanda para a área técnica, ter dado a conhecer que o plano director do Município de Belas, já está quase concluído, que uma determinada empresa chinesa lidera a sua execução.

Nós entendemos que um plano director não é do que um documento se quisermos normativo, que deve ser elaborado em razão do resultado da participação pública o mais abrangente possível da sociedade ou ainda há os que consideram, o plano director como um instrumento eminentemente político, cujo objectivo deverá ser o de dar transparência e democratizar a política urbana.

Assim sendo, gostávamos de frisar aqui três aspectos do plano director: o primeiro, tem a ver com a sua característica política, geral o plano director é vendido como um produto eminentemente técnico, de difícil elaboração e entendimento por leigos, devendo, sua elaboração estar a cargo de especialistas em urbanismo e demais ciências esotéricas na qual a participação do agente político é encarada como uma excrescência, algo a ser evitado a todo custo, a bem da racionalidade do plano. Tal concepção tecnocrática do planeamento, até muito pouco tempo hegemónica, deve ser afastada, porque a técnica joga sempre um papel fundamental no planeamento, mas não é tudo.
Se um plano for muito bom tecnicamente, mas inviável politicamente, não será executado, o mesmo se dá ao inverso, as propostas de um plano podem ser muito justas politicamente, mas se não tiverem nenhuma viabilidade técnica de serem implementadas, não passam de demagogia barata ou coisa parecida.
Pelo que julgamos necessário que haja um equilíbrio entre os aspectos técnicos e políticos do planeamento, lembrando sempre que , em última instância, planear é fazer política ( no sentido forte do termo, é claro).
Segundo, o aspecto tem a ver com a transparência, este é o aspecto que reputamos como o mais
importante, por ser quanto a nós o principal objectivo do plano director que é o de dar transparência à política urbana, na medida em que está explicitada num documento público, ou seja num documento normativo, e que tornam públicas as directrizes e prioridades do crescimento urbano, de forma transparente, para a crítica e avaliação dos agentes sociais, esta é a principal virtude de um bom plano director.
Directrizes e prioridades para o crescimento e expansão urbana, a história regista exemplos de demonstram que sempre houveram, planos com ou sem planos, a diferença é que com um plano, estas devem ficar mais claras. O plano director deve ter o papel de um livro de regras no jogo da cidadania, que até hoje tem obedecido à lei do mais forte.

O terceiro aspecto, o da democratização, é fundamental, pois só ele garante a transparência
necessária das regras do jogo. A democratização do processo de elaboração do plano director é
garantida, ao menos em tese, pela legislação correspondente, no nosso caso a lei do urbanismo e ordenamento do território e o regulamento dos planos.

Colocada a questão política do plano director , vamos aos aspectos técnicos, tem havido
muita mistificação em torno do plano director, que tem uma significação ideológica clara, por primeiro, tornar o plano director numa peça técnica, que elide a participação da sociedade civil e , pior ainda, justifica, pela aparente neutralidade científica, tomadas de decisões que vão favorecer
determinadas camadas da sociedade em detrimento de outra. Um bom exemplo desse mecanismo
paradoxal se dá nas normas de uso e ocupação do solo que promovem uma verdadeira segregação
social no espaço urbano, afastando as populações mais pobres das áreas nobres da cidade com
índices e padrões de uso e ocupação restritivos.

Como elaborar um plano director que dê certo?
Seria uma pretensão descabida se pretendêssemos mostrar a fórmula mágica do plano director
infalível, na verdade o segredo é este: não há fórmula mágica, no entanto, resguardada esta
observação, teceremos as nossas virtudes de razão do seguinte modo: em primeiro lugar, o plano director deve ser elaborado pela própria municipalidade, nunca deverá ser encomendado a uma empresa ou órgão público ou privado, no máximo poderá haver uma parceria, ou assessoria para assuntos técnicos específicos, mas os agentes da administração local deverão participar efectivamente de todas às etapas de elaboração, pois só assim terão plenas condições e interesse em implementar o plano director.

Salientamos aqui que, ao contrário do que se imagina, não é necessária muita assessoria técnica para a elaboração de um plano director, Qualquer administração é capaz de técnicos formados e bem treinados e com um mínimo de ajuda, de elaborar um plano director na medida de suas necessidades.

O Plano director deve ser do tamanho do município, nem maior , nem menor os municípios
pequenos deveram possuir um corpo técnico pequeno, mas os problemas urbanos também são (
salvo excepções ) de menor complexidade. De que adianta um pequeno município do interior
contratar uma empresa de planeamento central para elaborar um plano director que nem o administrador ou seu adjunto estarem capazes de entender?
O que afirmamos acima não quer dizer que se possa prescindir da competência técnica na elaboração do plano director. O que pretendemos fazer passar, é que os temas básicos tratados num um plano director ( controle do uso do solo, expansão urbana, parcelamento do solo, habitação, transportes electricidade, água e saneamento) são assuntos fundamentais em qualquer município com maior ou menor grau hoje me dia em Luanda. A diferença é que quando tais temas ao serem discutidos num um plano director, devem ser pensados de maneira integrada e numa perspectiva de médio e longo prazo e dentro de uma escala de prioridades.
As dificuldades de ordem técnica, como a escolha de uma opção mais viável economicamente ou de uma que cause menores problemas de impacto sócio-ambiental, podem ser superadas com o apoio técnico de órgãos públicos, como as universidades, os centros de pesquisas, os consultores privados idóneos.
As dificuldades mais difíceis de serem superadas, normalmente são de ordem mais política , pois é necessário romper com as práticas cliente listas e imediatistas (eleitoras) que caracterizam, infelizmente, o processo de tomada de decisão em todos os sectores da administração pública.

Em segundo lugar, deverá haver uma participação efectiva da comunidade, através de suas entidades representativas na elaboração do plano director, a forma mais aconselhável de participação de tais entidades é através de um Conselho de uma espécie de Planeamento, no qual deverão ter assento os representantes das entidades de classe, universidades, associações de moradores, representantes do poder público e outros. Um bom exemplo deste tipo pode ser o conselho Municipal de Planeamento.
Aguisa de conclusão gostávamos de manifestar a nossa “indigestão” pelo facto de recrutar uma empresa estrangeira para gizar o plano director do Município de Belas conforme aludido pelo Vice governador de Luanda, pelas razões avançadas acima, adicionando partilharmos da tese de alguns estudiosos de conhecidas competências técnicas, quando dizem: “que não se deve entregar a estrangeiros as questões ligados ao urbanismo, por uma questão de segurança nacional” tivemos um exemplo no tempo da outra senhora, quando cá esteve a trabalhar num plano director em Luanda uma especialista colombiana, e que lhe foi dada 48 horas para abandonar o país. E naquele tempo quem controlada toda politica urbana cá era o Ministério do ultramar.
Cláudio Ramos Fortuna
Urbanista

Sem comentários: