quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Operação Rachel

 


Apesar de a África do Sul e Moçambique terem motivações diferentes, tinham no entanto um objectivo comum: a destruição de esconderijos de armas contendo os restos da guerra e a limitação das redes criminais entre os dois países. Para o Serviço de Polícia Sul Africano (SAPS), este programa estava no âmbito do mais vasto combate ao crime urbano violento. O objectivo de Moçambique era o desarmamento geral do país, principalmente das áreas rurais.

Foi este objectivo comum que permitiu a ambos os países juntarem os seus recursos e ultrapassar as fronteiras nacionais: o SAPS dispunha dos meios e dos recursos, os quais podiam ser complementados com o conhecimento do terreno e a legitimidade para a intervenção por parte de Moçambique. O modo de agir normal seria combinar estes recursos em operações conjuntas no interior de Moçambique e isto foi o que aconteceu – equipas da polícia Sul Africana e Moçambicana entraram no seio das comunidades com o fim de destruir esconderijos de armas. É igualmente notável que, por trabalharem em conjunto, estas equipas ultrapassavam décadas de desconfiança entre os dois países o que serve bem para ilustrar a capacidade e as possibilidades da cooperação regional.

O sucesso da Operação Rachel, iniciada em 1995 e ainda em curso , é inquestionável – no decurso das nove operações que tiveram lugar em meados de 2003, foram descobertos mais de 600 esconderijos de armas e várias toneladas de armamento e munições foram destruídos. Antes do início da Operação Rachel o preço no Soweto de uma AK-47 (a arma mais utilizada durante o conflito Moçambicano) era de cerca de R100.00 ( USD $14 ); hoje em dia, a mesma arma custa R3000.00 (USD $430 ),16 o que é um indicador impressionante. Mas o sucesso da Operação Rachel parece ir muito além do impacto directo da destruição de SALW.

Ultrapassando Constrangimentos Históricos

As operações no âmbito da Operação Rachel são baseadas em informações recolhidas no seio das comunidades Moçambicanas, assim contribuindo para o estabelecimento de confiança entre os cidadãos e a polícia e entre instituições no sector da segurança; as informações recolhidas são distribuídas pela polícia dos dois países e as intervenções são planeadas em conjunto, edificando assim capacidade e laços entre os dois países que se suspeitaram mutuamente durante décadas. Comunidades que há vinte anos teriam fugido assim que avistassem um uniforme Sul Africano recebem com agrado as equipas da polícia Sul Africana e Moçambicana, que consideram como companheiros no empenho contra a presença de SALW no seu seio. A contribuição destas iniciativas para a mudança da mentalidade colectiva não deve ser menosprezada.

A Operação Rachel estabeleceu as fundações para a posterior cooperação entre os dois países. As operações são prova de que ressentimentos históricos podem ser ultrapassados; que operações conjuntas podem ser um veículo potente para a edificação de capacidades; que objectivos comuns podem ser um factor de motivação importante; que a vontade política é fundamental para ultrapassar certos constrangimentos; e que pessoas com as mesmas ideias existem de ambos os lados das fronteiras. Claramente, operações do tipo Rachel podem contribuir fortemente para a edificação da paz na região.

O Desarmamento como Corolário

No entanto, a Operação Rachel não foi concebida como uma iniciativa de desarmamento para Moçambique mas antes, como uma medida para impedir e controlar a transferência de SALW de Moçambique para a África do Sul. O desarmamento parece ser um derivado desta estratégia e não tanto como o objectivo principal. A Operação Rachel foi considerada como um dos meios para a prevenção do crime na África do Sul, tendo os meios financeiros sido dados, na sua maior parte, pelo orçamento do Serviço de Polícia Sul Africano (SAPS). Apesar da polícia Moçambicana ter desejado abranger a totalidade do território, o SAPS estava inicialmente mais interessado na parte sul do país, uma vez que era mais provável que as armas aí escondidas acabariam por entrar na África do Sul.

Nos estágos iniciais da Operação Rachel o objectivo comum de destruir os esconderijos de armas foi o elo de união das instituições de ambos os países.
Posteriormente, começaram a vir à tona diferentes motivações, as quais afectaram o planeamento das operações – quanto mais para norte os esconderijos se encontravam, mais dispendiosas se tornavam as operações, mais tempo era necessário e mais difíceis eram os preparativos logísticos.

Moçambique não dispunha nem da capacidade nem dos recursos para continuar por si só e a África do Sul não desejava investir fundos em iniciativas onde colheria poucos benefícios. O Serviço de Polícia Sul Africano, no entanto, estava disposto a continuar a melhorar a capacidade da polícia Moçambicana e a contribuir com pessoal, meios e tempo. O problema dos recursos foi ultrapassado quando doadores começaram a contribuir com a maior parte do orçamento da Operação Rachel – em 2003, pela primeira vez desde o início da operação, Rachel foi alargada a todas as províncias de Moçambique com excepção de duas: Inhambane e Sofala. Ambas estas províncias já tinham sido cobertas em operações anteriores – Inhambane com sete incursões e Sofala com dez, de um total de 19 operações.

A Necessidade de Iniciativas Nacionais de Desarmamento

A sustentabilidade das contribuições da África do Sul para iniciativas com pouco impacto no país pode eventualmente vir a ser questionada. A tendência parece ser para o apoio da África do Sul diminuir e para Moçambique passar a ter um papel de maior liderança nas iniciativas de desarmamento nacional. Devido à escassez de recursos do governo Moçambicano, é provável que tais iniciativas de desarmamento requeiram o apoio de um doador, ou mesmo de vários doadores. Uma tentativa anterior, por parte de um doador, para fornecer fundos directamente ao Ministério do Interior no contexto da Operação Rachel, dando assim à polícia Moçambicana maior autonomia para planear e executar intervenções específicas de desarmamento, encontrou obstáculos intransponíveis e o financiamento acabou finalmente por ser feito através da África do Sul.

O desarmamento deverá provavelmente continuar a ser necessário por mais alguns anos em Moçambique, requerendo uma estratégia integrada que vá para além das presentes operações da Operação Rachel. A polícia em Moçambique levou a cabo algumas intervenções para ‘desactivar’ esconderijos de armas. Contudo, o significado de ‘desactivar’ não foi claro para a equipa de pesquisa. Segundo alguns dos entrevistados, o material é normalmente destruído pelas forças armadas Moçambicanas; segundo outros, é armazenado e posteriormente destruído no decurso das operações Rachel seguintes, uma vez que Moçambique não tem meios para proceder à sua destruição; finalmente, segundo outros ainda, este equipamento é armazenado e mais tarde será ‘escolhido ou separado’.

Para alguns entrevistados o material é normalmente destruído pelas forças armadas Moçambicanas; de acordo com a avaliação da equipa de pesquisa, as três diferentes afirmações são provavelmente verdadeiras e a desactivação, pela polícia Moçambicana, de tais esconderijos de armas acontece de uma forma ad hoc devido à inexistência de uma estratégia consolidada. A existência das operações Rachel pode, até agora, ter ocultado a necessidade de um processo integrado para o desarmamento mas o Ministério do Interior, como a principal instituição no interior de Moçambique, pode julgar necessário começar a desenvolver estratégias para um desarmamento que seja permanente, transparente e sustentável em Moçambique.

O Projecto TAE

Paralelamente às iniciativas de desarmamento dirigidas pelo governo, como a Operação Rachel, a sociedade civil Moçambicana também está a contribuir para este esforço com o projecto Enxadas por Armas (TAE) do Conselho Cristão de Moçambique (CCM). Este projecto cobre presentemente 26% do território Moçambicano e, em Agosto de 2001, já tinha trocado 795.856 chapas de zinco, 1.808 bicicletas, 674 máquinas de costura, 1 tractor, 2.969 enxadas, 532 arados, 202 portas, 402 janelas, 78 utensílios de cozinha, 68 facas de cortar capim e 600Kg de diferentes sementes por 200.000 armas e munições.17

Segundo a mesma fonte o projecto beneficioucerca de 26.000 famílias. Apesar do projecto TAE ser dirigido inicialmente a indivíduos possuidores de armas, cedo foi verificado que as armas que estavam sendo trocadas, eram, de facto, provenientes de esconderijos em vez de indivíduos privados. Isto criou vários problemas que não tinham sido previstos na concepção original do projecto: o transporte ocasional de grandes quantidades de SALW dos esconderijos para o armazém do TAE; o armazenamento e controle das SALW armazenadas; e o que fazer com as informações obtidas sobre esconderijos de armas.

Através destas adaptações, o projecto TAE é considerado hoje com complementar da Operação Rachel e não como um programa autónomo. O TAE é informado previamente sobre uma operação Rachel, uma vez que necessita dos recursos trazidos pelos Sul Africanos para a destruição das armas recolhidas. Trabalhadores do TAE afirmaram à equipa de pesquisa que contam com a capacidade Sul Africana para destruir grandes quantidades de armas, uma vez que a polícia Moçambicana não tem os fundos necessários para permitir tal destruição. Isto cria um problema significativo dado que o TAE tem muitas vezes que armazenar e controlar grandes quantidades de SALW enquanto aguarda pela operação Rachel seguinte. Entregar este equipamento à polícia não parece ser uma solução aceitável, devido à distinta falta de capacidade da polícia Moçambicana para gerir o armamento sob a sua supervisão.

Complementaridade e Riscos

De acordo com um trabalhador do TAE, a complementaridade de métodos entre as duas iniciativas é reforçada pelo facto de ambos o TAE e a Operação Rachel utilizarem a mesma rede de informadores, com o TAE a fornecer à Operação Rachel informações obtidas em áreas menos acessíveis ou onde haja mais desconfiança da polícia.. A inclusão de uma organização da sociedade civil no enquadramento de uma iniciativa dirigida pelo governo funcionou até agora muito bem e é louvável, mas implica um risco importante – uma associação muito próxima entre o TAE e iniciativas governamentais pode criar preocupações não só nas comunidades locais como também entre os doadores. As comunidades parecem estar mais à vontade em passar informações sensíveis sobre esconderijos de armas ao TAE do que à polícia. Se elas se apercebem da proximidade da realação entre o TAE e a polícia, esta confiança pode ser afectada ou destruída. Do mesmo processo original do TAE tenha sido antes do seu tempo. Isto parece plausível uma vez que agora que os econderijos de armas estão a diminuir nas áreas em que o TAE opera, mais proprietários individuais estão a aproximar-se para trocar as suas armas por ferramentas.

O trabalho do TAE com as comunidades no que respeita a esconderijos de armas é importante e devia ser incorporado nas iniciativas e incentivos do seu projecto, tornando-os relevantes em relação à realidade no terreno. O TAE tem um posicionamento único ao nível das comunidades.

A Importância dos Esconderijos de Armas

A afirmação dos trabalhadores do TAE de que a maior parte dos esconderijos de armas são presentemente propriedade de partidos políticos em Moçambique pode contribuir para elucidar as percepções em mudança e devia ser tomada em consideração para o planeamento de qualquer estratégia de desarmamento. Isto é particularmente reforçado quando trabalhadores do TAE também afirmam que:
“... estes proprietários estão normalmente abertos a falar connosco. A única resistência que encontrámos até agora tem sido em termos de precaução, em termos de colaboração e nunca por resistência apenas.

Estes funcionários e partidos políticos não querem ser associados a estes esconderijos pois as suas melhores oportunidades políticas existem quando eles falam de paz e não de vingança”.19

Na sua monografia sobre a situação do fluxo de armas em Moçambique, Martinho Chachiua considera três origens para as SALW em Moçambique: a) esconderijos pertencentes a ambos os partidos em conflito; b) esconderijos pertencentes a soldados desmobilizados ou que estão ainda ao serviço activo das forças armadas; c) armas mantidas por cidadãos individuais.20

Moçambique teve as suas primeiras eleições democráticas, presidenciais e parlamentares, em 1994, dois anos depois de ter assinado o AGP. A experiência das primeiras eleições em Angola supervisionadas pelas NU, era ainda muito recente para ser facilmente ignorada e, embora os Moçambicanos desejassem a paz, ambos os partidos em conflito ainda se suspeitavam mutuamente. E assim, mantiveram os seus esconderijos de armas, o que lhes dava poder no caso do processo eleitoral correr mal. Tal como aconteceu, as primeiras eleições Moçambicanas foram um sucesso tremendo com mais de 85% do eleitorado a votar, dando ao partido dominante, Frelimo, 129 lugares no parlamento e 112 à Renamo. O candidato presidencial da Frelimo, Joaquim Chissano, recebeu 53,3% dos votos, enquanto o candidato da Renamo, Afonso Dhlakama, recebeu 33,7%.

Mas a edificação da confiança é lenta e o processo eleitoral foi marcado pelo boicote, durante um dia, por parte da Renamo. Para além disto, na altura em que a estabilidade política emergia, a insegurança também estava a aumentar. A criminalidade aumentava drasticamente e viajar nas estradas principais de Moçambique estava a tornar-se de novo inseguro. É portanto concebível que, no período a seguir às primeiras eleições, tanto a Renamo como a Frelimo ainda manteriam os seus esconderijos de armas – a Renamo para manter alguma força política, a Frelimo para garantir a supremacia militar. Dada a importância política que estes esconderijos ainda tinham na altura, pode ser presumido que os guardas que deles tomavam conta recebiam os seus salários, assim diminuindo a tentação de vender as armas ou ainda as informações sobre os locais onde se encontravam a terceiras partes.

Autores, escrevendo sobre as SALW em Moçambique, estabelecem a ligação entre as armas utilizadas na prática do crime em 1994/1995 e soldados desmobilizados. Vines, que trabalhou extensivamente com soldados desmobilizados, apresenta esta ligação através de entrevistas com contrabandistas Moçambicanos de armas.21

Impacto das Iniciativas de Desarmamento em Percepções Talvez o melhor indicador do sucesso de ambos estes programas –Operação Rachel e TAE – seja a mudança de percepções sobre a origem das armas utilizadas na prática de crimes. Enquanto em 1994/1995 ninguém hesitaria em atribuir a origem das armas usadas na prática de crimes a esconderijos de armas contendo restos da guerra e à sua utilização e provisão por soldados desmobilizados, as percepções sobre este assunto parecem ser hoje diferentes. A percepção geral da ligação entre soldados desmobilizados e a criminalidade foi debatida por várias pessoas durante o trabalho de campo, apesar de ser a que se mantém.

Segundo disse um funcionário do ministério do interior: “Armas são utilizadas ocasionalmente, mas nem sempre, para cometer crimes. Muitos criminosos são de meia idade, soldados desmobilizados e desempregados. Por exemplo, o assassino de Siba Siba22 foi a um soldado da Casa Militar, treinado pelos chineses. As armas utilizadas são principalmente pistolas AKM e Makarov – restos da guerra, pois alguns criminosos têm ligações com pessoas que, durante a guerra, foram colocadas a tomar conta dos esconderijos de armas. Outras armas são alugadas a pessoas que são seus proprietários legais ou foram compradas a pessoas encarregadas de guardar esconderijos.... No Maputo há dois tipos de crime – crime organizado e pequeno crime por razões de ordem económica.

Tendem a utilizar o mesmo tipo de armas, apenas alguns crimes organizados utilizam outras tácticas, principalmente quando os criminosos foram soldados previamente ( por exemplo, o caso de Siba Siba ) – Os soldados, previamente afectos à Casa Militar, que garantem a segurança ao governo, são conhecidos dos chefes do crime organizado… Alguns soldados desmobilizados preferem dizer que estão desempregados a dizer que foram membros da Casa Militar.”23

Membros de organizações não governamentais (ONGs) trabalhando com soldados desmobilizados refutam a percepção de que soldados desmobilizados são mais propensos a cometer crimes do que qualquer outro grupo. Durante o inqérito levado a cabo em Chimoio, nenhum dos respondentes mencionou soldados desmobilizados em relação ao crime.

Sem querer ir muito longe neste debate, é possível que esta dupla percepção possa estar ligada à existência de esconderijos de armas e ao impacto das iniciativas de desarmamento ainda a decorrer em Moçambique. É possível que soldados desmobilizados não sejam mais propensos a cometer crimes do que outros grupos, mas dadas as dificuldades económicas com que muitos deles vivem e dado o acesso que podem ter tido a armas escondidas, é difícil acreditar que alguns não tivessem sido tentados a vender estas armas a quem as quizesse comprar, incluindo redes criminosas. Este pode ter sido o caso imediatamente após 1994, mas à medida que mais esconderijos estão sendo destruídos, este tipo de oferta pode estar a diminuir fazendo dissipar desta forma a percepção da ligação entre soldados desmobilizados e o crime.

Cada esconderijo desmantelado é menos uma fonte de armas, qualquer que seja a natureza do mercado.

Funcionários do governo e trabalhadores das ONGs têm afirmado com frequência que as armas capturadas relativamente à criminalidade parecem ser novas e não restos da guerra. Segundo um trabalhador baseado na comunidade, “quando vamos às comunidades, conseguimos recolher armas que são absolutamente novas. De onde é que elas vêm? E por que é que eles as trazem a nós, em vez de as entregarem para destruição?”24 A resposta óbvia parece ser que eles podem não ter confiança nas instituições governamentais para gerir essas armas.

Apenas podemos especular sobre a origem dessas armas novas: se provêm de esconderijos, então a suspeita da ONUMOZ de que ambos os partidos no conflito estavam a importar armamento na altura, parece ter sido substanciada. Mas há ainda outra origem possível para estas armas e essa é a dos armamentos sob a supervisãoo do governo. Esta parece ser a percepção mais comum nos tempos que correm em Moçambique – que o crime está sendo cometido com armas alugadas ou vendidas por polícias ou soldados aos criminosos. O inquérito realizado em Chimoio parece confirmar esta percepção generalizada.

No seu discurso ao Parlamento, em Fevereiro de 2003, o Procurador Geral da Justiça em Moçambique substancia esta percepção ao mencionar especificamente o que ele considera ser dois tipos de crimes militares a serem cometidos presentemente em Moçambique: 1) o roubo de equipamernto militar para venda, e 2) o empréstimo ou aluguer de armamento de guerra a criminosos:

“...Contudo, temos que admitir que há crimes militares que não desapareceram com o fim da guerra. Alguns exemplos são:

• Situações tais como na Beira onde, devido a manifesta irresponsabilidade, alguns oficiais utilizaram armamentos de guerra contra a polícia, ao atacarem uma estação da polícia;
• o roubo de equipamento militar e a sua venda subsequente;
• o empréstimo ou aluguer de armamento a criminosos para as suas actividades criminais;
• a falta de comparência dos que foram escolhidos para prestar o Serviço Militar Obrigatório na altura da incorporação e outras infracções não relacionadas directamente com a situação de guerra mas que deviam ser evitadas por meio de medidas especiais”25

Este problema serve para realçar a necessidade de, em Moçambique, se ter em consideração o sector da segurança, no seu todo, como parte de uma estratégia de prevenção e controle de SALW e da redução da criminalidade na região. Dez anos depois do AGP parece ser altura para o GdM e os doadores olharem para este sector com o objectivo da sua integração no contexto duma visão mais vasta do desenvolvimento e da erradicação da pobreza.

A questão das “armas novas” encontradas, como mencionado por vários dos entrevistados, manteve-se confusa para a equipa de pesquisa. Pessoas ligadas à Operação Rachel e ao projecto TAE mencionaram com frequência que algumas armas em esconderijos parece nunca terem sido usadas e, também, que a maior parte do equipamento está em boas condições de funcionamento. Alguns dos trabalhadores das ONGs foram categóricos ao afirmar que tais armas “novas” não podiam ter estado em esconderijos, embora não tivessem conseguido substanciar as suas afirmações.

Este caso serve como um bom exemplo para ilustrar a necessidade de se criar um sistema de marcação para as armas utilizadas pela polícia e pelos militares em Moçambique. Na ausência de um tal sistema, será difícil diminuir a especulação sobre a origem das armas utilizadas na criminalidade. É no interesse do GdM implementar tal marcação, assim permitindo um quadro mais exacto da relação entre os proprietários de armas legais ou ilegais em Moçambique.

Notas
1.Ver<http://www.un.org/Depts/dpko/dpko/co_mission/onumozM.htm>
(Abril 2003).

2. M Chachiua & M Malan, “Anormalidades e aquiescência: o processo de paz Moçambicano revisitado”, African Security Revue 7 (4), 1998, http://www.iss.co.za/Pubs/ASR/7No4/Anomalies/html (Outubro2003).

3. Num email de um estudante da univ.de Nova Yrk para o embaixador Kamal, datado de 6 de Nov de 2000, sobre a ONUMOZ, a missão é considerada como tendo falhado em 3 aspectos: do desarmamento, a reintegração dos antigos combatentes e poucas armas destruídas. Documento disponível em http://www.geocities.com/decharles-24/assignment7.html (Abril 2003).

4. A Vines, “A luta continua: destruição de armas ligeiras em Moçambique”, Basic Papers, Abril 1998, Número 25, 1998, http://www.basicint.org/pubs/ Papers/BP25.htm (Junho 2003). Não há clareza sobre a origem dos dados que Vines obteve e que permitissem fazer tal afirmação mas, se as FADM não estavam armadas em excesso antes da ONUMOZ, por certo estavam armadas em excesso depois da ONUMOZ. Em 1994, quando a ONUMOZ partiu, o exército tinha um total de cerca de 12.000 soldados e oficiais e a ONUMOZ entregou cerca de 200.000 SALW a esta força.

5. BASIC, Africa: o desafio da destruição de armas ligeiras durante missões de manutenção de paz, Basic Papers, Dezembro 1997, Número23, http://www.basicint.org/ pubs/Papers/BP23.htm (Outubro 2003).
6. Entrevista pessoal com um trabalhador da ONG em Maio de 2003. A mesma afirmação foi feita por representantes da sociedade civil durante o encontro em Setembro.
7. Vines, op.cit.
8. Entrevista pessoal em Agosto de 2003.
9. Este número parece estar de acordo com as quantidades citadas por M Chachiua, “A situação do fluxo de armas em Moçambique”, ISS, Monografia 34, 1999, http://www.iss.co.za/Pubs/Monographs/No34/TheStatus.html (October 2003).
10. A Vines, op.cit.
11. M Chachiua, “Segurança interna em Moçambique: preocupações contra políticas”, African Security Review 9 (1), 2000, http://www.iss.co.za/Pubs/ASR/9No1/%20SecurityMozambique.html , (Outubro de 2003).
12. Esta relutância em comunicar os crimes tem sido notada pela maior parte dos autores escrevendo sobre questões criminais em Moçambique.
13. Entrevistas pessoais com funcionários do governo e cidadãos durante a pesquisa no terreno.
14. A Vines, op.cit.
15. N Stott, Aprender com a prática:Recolha de armas na África Austral, uma avaliação da Operação Rachel, Instituto de Estudos de Segurança, a ser publicado.
16. N Stott, op.cit.
17. Discurso de acolhimento pelo Secretário Geral do CCM, Rev. Lucas Amosse, durante a Conferência Nacional sobre a Proliferação de SALW ilegais , Maputo, Agosto 29-31de 2001. Disponível em http://www.armas.tropical.co.mz/(docs)sgccm.htm. O número de 200,000 armas inclui munições. Uma avaliação do projecto, feita pela BICC mais recentemente, ainda não publicada, afirma que o TAE recolheu mais de 7.000 armas de fogo e mais de 200.000 munições desde o início do projecto.
18. Entrevista pessoal em Julho de 2003
19. Entrevista pessoal em Junho de 2003.
20. M Chachiua, “A situação do fluxo de armas em Moçambique”,op.cit.
21. A Vines, op.cit.
22. Siba Siba Macuácua era um jovem economista Moçambicano que procedia à auditoria das contas do Banco Austral, cujos fundos foram aparentemente usurpados pela corrupção ao nível dos escalões mais altos do partido Frelimo. Carlos Cardoso estava a investigar um caso semelhante num outro banco, o BCM, na altura da sua morte. Siba Siba “caiu” do sétimo andar do edifício e a sua morte foi inicialmente atribuída a acidente ou suicídio. Mais tarde , um soldado desmobilizado foi preso como sendo o seu assassino. A família de Siba Siba está presentemente a tentar conseguir que o assassino seja julgado.
23. Entrevista pessoal em Abril de 2003. Entrevista pessoal com um promotor de paz a trabalhar com uma ONG Moçambicana. Discurso do Procurador Geral da República, Dr. Joaquim Madeira, no Parlamento em 20 de Fevereiro de 2003. Disponível no http://www.govmoz..gov.mz/
 

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