segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Apelamos para bom senso para não se deitar tudo a perder!

 

Conversações Renamo-Governo
Vamos começar por congratular a decisão do Conselho de Ministros, de criar uma comissão governamental para negociar com a Renamo. Isso mostra ainda que por enquanto não inequivocamente que começa a haver algum bom senso e relativa vontade política para aproximar as partes e caminhar-se no sentido de dar mais substância à construção da democracia no País. E acima de tudo revela que afinal o Governo reconhece a legitimidade das reivindicações da Renamo que em si são afinal uma súmula do que a esmagadora maioria dos moçambicanos também deseja.
Resta saber por ora qual vai ser o desfecho do diálogo, mas para já é sem dúvida uma alma nova que se permitiu que aparecesse quando tudo parecia caminhar a olhos vistos para o precipício, dada a arrogância para que apontava a primeira comissão da Frelimo que o presidente da República tentara impingir em atitude de manifesto desprezo por quem reivindica mudanças de fundo apoiadas, aliás, até por nomes sonantes da sociedade civil.
Há agora receio de que a não serem encaradas pelo Governo com seriedade, as anunciadas negociações – em que estão na mesa pontos cruciais que não interessam somente à Frelimo e à Renamo, mas, sim, a todos os moçambicanos
– acabem por abortar conduzindo-nos a todos a um recuo que poderá tornar-se fatal para Moçambique e para quem acreditou que de facto os compromissos de Roma eram para durar no espírito e no tempo e não apenas para permitir que alguns voltassem a ressuscitar a ideia de uma Frelimo força dirigente da sociedade e do Estado, como preconizava a primeira Constituição monopartidária que nos levou à Guerra Civil e ao caos.
A figura que irá liderar a comissão governamental criada a semana passada pelo Conselho de Ministros, para negociar com a Renamo, José Pacheco, actual ministro da Agricultura e ex-ministro do Interior, não é de boas recordações enquanto dirigente do Estado. Em 2000, quando era Governador de Cabo Delgado, Pacheco ficou relacionado com o massacre dos membros da Renamo em Montepuez, que se manifestavam contra os resultados eleitorais das eleições do ano anterior. Pelo menos mais de uma centena de membros da Renamo morreram asfixiados nas celas da Polícia em Montepuez e a Renamo sempre ligou José Pacheco a este massacre, tendo-o como de quem partiu a ordem que permitiu o assassinato dos correligionários de Afonso Dhlakama.
Mais recentemente, em 2010, enquanto ministro do Interior, José Pacheco ficou mal na fotografia perante todos os moçambicanos, ao chamar de “vândalos e marginais” a população que protestava contra o custo de vida. Apesar das críticas vindas de quase todos os quadrantes da sociedade, José Pacheco não se retratou perante as suas afirmações.
Outra preocupação é a forma leviana como o Governo começou por tratar as reivindicações da Renamo. Verdade seja dita, a criação da comissão governamental aconteceu depois de muito alarido na Imprensa e da tentativa, por parte de quem governa, de desvalorizar as reivindicações do líder da Renamo, que são, na sua maioria, preocupações de quase todos os moçambicanos e de muitos outros partidos – pelo menos aqueles que não estão pendurados nas tetas do regime a sugar o suor dos moçambicanos.
A Renamo exige, em palavras simples e despidas de ruídos políticos e militares, que o Estado dê primazia aos moçambicanos e não a um grupo de membros do partido no Poder. Quer a Renamo, como todos os moçambicanos discriminados, em suma a despartidarização do Aparelho do Estado. Isto quer dizer que querem tão simplesmente que o Bilhete de Identidade passe a ser instrumento bastante e suficiente para conferir direitos iguais a todos os moçambicanos, e o “cartão vermelho” da Frelimo deixe de ser usado para privilegiar alguns nas instituições e nos órgãos do Estado.
A Renamo está também a exigir que as riquezas nacionais beneficiem a todos os moçambicanos para que se altere a situação que até agora tem persistido e tem sido incansavelmente denunciada por alguma Imprensa, como é o simples caso, por exemplo, do Mercedes-Benz S 500 para a presidente da Assembleia da República, Verónica Macamo, cujo preço, nos cálculos d´@Verdade, seria suficiente para comprar quatro autocarros com capacidade para transportar mais de 100 pessoas em cada trajecto, podendo satisfazer a milhares de pessoas por dia.
A Renamo exige que os agentes da Polícia da República de Moçambique deixem de ser transformados em instrumentos de repressão ao mesmo Povo, ao serviço do regime que pretende arregimentar-nos a todos, e passe antes a ser instrumento de garante de segurança aos cidadãos – todos por igual, deixando de servir de instrumento de repressão ao serviço de um punhado que tornou o Estado a sua cotada.
Em poucas linhas, são estas algumas das exigências da Renamo, que o Governo e a sua máquina da propaganda começou por tentar desvalorizar e até ridicularizar mas que acabou em boa hora por compreender que a Renamo se preparou devidamente para impedir que os abusos continuem.
Desde logo, a Frelimo, através dos seus comentaristas na televisão, rádio e jornais públicos, apareceu a dizer que não havia nada a negociar, ora porque tudo o que opunha a Renamo e o Governo foi selado pelo Acordo Geral da
Paz, ora porque a Assembleia da República era o espaço de negociação preferencial entre as forças políticas lá representadas.
Depois de ver que essas justificações despropositadas não eram acolhidas, mesmo até por figuras responsáveis do partido liderado por Guebuza, o partido no poder decidiu criar uma comissão partidária, integrando membros do partido que até então nunca deles se tinha ouvido falar pelo que prontamente foi recusada pela Renamo, não só por ser irrelevante, mas também por ser partidária.
A Renamo argumentou que pretende é negociar com o Estado e o Governo é que representa o Estado moçambicano para actos internos e externos.
E assim parece que finalmente agora está tudo a caminhar no bom sentido.
Pelo menos o primeiro passo foi dado, que é o reconhecimento da existência por ambas as partes da necessidade de se dialogar.
A nova comissão governamental integrando o ministro da Agricultura, José Pacheco, o vice-ministro das Pescas, Gabriel Muthisse, e o vice-ministro da Função Pública, Abdul Remane, já está formada. A Renamo também tem a sua equipa negocial anunciada, chefiada pelo seu SG.
Congratulamo-nos por estar a haver bom senso, mas lembramos que caso não haja humildade e discernimento suficiente o pior ainda pode aí vir.
Se a arrogância e a tentativa de desvalorizar as reivindicações da Renamo, que caracterizaram as primeiras reacções do Governo face às reivindicações da Renamo, prevalecerem durante as conversações, pouco terá significado a criação desta comissão.
O nosso desejo é que o Chefe de Estado saiba medir convenientemente o grau de descrédito a que chegou a sua governação e perceba que desta vez mesmo dentro do seu próprio partido há quem se indigne contra a arrogância que põe em risco não só os investimentos estrangeiros como sobretudo o que nós moçambicanos já avançámos a promover um País próspero que se quer cada vez mais democrático e plural e não apenas de alguns que insistem em querer abocanhá-lo.
Canal de Moçambique – 28.11.2012

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