sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Quando a última palavra cabe ao povo

Subida do preço de chapa:
 
Munícipes de Maputo e Matola chumbam a decisão da edilidade de agravar a tarifa de “chapa”, sem antes criar condições para um serviço de transporte digno
Maputo (Canalmoz) – A bancada da Frelimo na Assembleia Municipal de Maputo, decidiu por voto maioritário agravar a tarifa do transporte público e semi-colectivo urbano, respondendo, assim, positivamente à proposta do conselho municipal local, também dirigido pela Frelimo.
Seguiu-se a Matola, tomando a mesma decisão. Depois mobilizou-se a Polícia para impor a decisão aos utentes dos transportes, mas estes recordaram as autoridades que “a última palavra cabe ao povo”.
O povo quis se fazer ouvir e paralisou, ontem, as duas cidades que formam o Grande Maputo. As actividades sociais e económicas deixaram de funcionar e as autoridades que não investem nas melhores condições de transporte, tiveram que investir na Polícia.
Os munícipes das cidades de Maputo e Matola saíram às ruas para protestar contra o aumento da tarifa de transporte, sem que haja garantia de um serviços de transporte digno. Todos os munícipes que falaram à nossa reportagem, mostraram que a sua indignação não era basicamente o aumento de 7MT para 9MT ou 5MT para 7MT, mas sim o aumento da tarifa sem que haja garantia do fim de encurtamentos de rotas.
Na cidade de Maputo a maior concentração aconteceu na praça dos combatentes, vulgarmente conhecida como Xiquelene onde a população tomou de assalto a terminal e impôs a sua vontade: nenhum transportador podia carregar pessoas. Os autocarros dos transportes públicos de Maputo tiveram que sair entre pedradas e vaias. A polícia teve de dispersar os manifestantes só que nenhum transportador fez-se ao local novamente.
Houve também paralisação e concentração de pessoas, sobretudo jovens, nos bairros de Inhagoia, Luís Cabral, Malanga e Zimpeto.
Na Matola, a Estrada Nacional numero 4, que liga os municípios da Matola e Maputo, via portagem, esteve fechada durante parte da manhã. No Bairro de Nkobe a população saiu à rua, barricou as estradas com paus e pneus em chamas em sinal de protesto não só contra o aumento do preço dos chapas mas também contra a o mau estado das vias de acesso, segundo depoimentos dos residentes locais à STV.
Recolher obrigatório
Estes protestos foram o suficiente para paralisar todas as actividades económicas e sociais nos municípios de Maputo e Matola. Até ao meio dia houve uma espécie de recolher obrigatório. Do centro da cidade de Maputo, para onde as pessoas se tinham deslocado para o trabalho, saiam multidões de pessoas caminhando, para casa. As estradas e avenidas estavam lotados – não de viaturas – de pessoas andando a pé para os bairros residenciais periféricos.
Até as 11 horas a reportagem do Canalmoz soube que houve ordens para parquear os autocarros dos TPM que vinha circulando desde de manhã.
Civismo nos protestos
A viaturas particulares continuaram a circular. Embora poucas, mas não eram apedrejadas como foi nos protestos anteriores de 1 e 2 de Setembro de 2010 e 05 de Fevereiro de 2008.
O comércio nos bairros fechou por medo dos proprietários dos “contentores”, de ver seus bens saqueados, mas não há relatos de vandalismo ou saque de bens alheios. Efectivamente os protestos de ontem foram civilizados. Os povo gritou para ser ouvido pelos governantes, mas não destruiu bens públicos nem privados.
Polícia em todo canto
O Governo e o município que não investe num sistema de transporte digno para os moçambicanos, investiu ontem numa força de segurança quantitativamente dispersa pelas cidades de Maputo e Matola e armada.
Em alguns pontos da cidade de Maputo e Matola o dispositivo policial era de tal sorte que a população tinha até medo de estar em grupo. Mas no bairro Luís Cabral, arredores da cidade de Maputo, jovens barricaram a estrada em sinal de protesto mas viriam mais tarde a ser dispersos pelos policiais.
As contas à vida
Lembre-se que o salário mínimo nacional ronda os 2 500 meticais. As pessoas dizem-se sufocadas perante uma elite político-governamental insensível. Em relação ao transporte em si, a população exige medidas para acabar com encurtamentos de rotas, um fenómeno que tem criado muitos transtornos aos utentes dos transportes semi-colectivos. Num trajecto em que por norma o passageiro devia pagar 5 meticais chega-se a pagar 20 meticais porque os transportadores fazem das paragens intermediárias as terminais cobrando valor adicional a ligação com a paragem subsequente e assim sucessivamente. A polícia municipal nada faz para inverter o cenário, e longe disso, monta grupinhos de extorsão nas vias públicas onde vão cobrando dinheiro aos automobilistas. As pessoas assumem a necessidade de agravamento da tarifa de transporte, mas o que não toleram são as condições em que o transporte é efectuado: encurtamentos de rotas e precariedade das viaturas.
Desvio e encurtamento de rotas é a causa das manifestações
Na Matola, alguns munícipes ouvidos pela reportagem do Canalmoz apontaram os encurtamentos e desvios de rotas como a causa do seu protesto. A população exige às autoridades municipais, a resolução imediata da problemática de encurtamento de rotas, antes de permitir a entrada em vigor das novas tarifas.
Zeferino Ndava, que se apresentou como funcionário de uma Escola Secundária na Matola, admitiu ser justa actualização das tarifas, mas disse que “peca por não ser acompanhada por outras medidas que possam justificar que o pagamento do valor agravado”.
“Sem estar a favor das manifestações violentas, considero justa a exigência da população. Na verdade, nós não estamos contra a subida de preços, mas o que mais nos preocupa é o desvio de rotas e encurtamentos. Se formos a ver, devido as ligações a população por dia chega a gastar o dobro do dinheiro do que teria que pagar se os chapas chegassem realmente ao destino”, disse este munícipe.
UNICOTRAMA introduz novas medidas para combater encurtamentos
Devido à esta situação de carência de “chapas”, a União das Cooperativas de Transportes da Matola (UNICOTRAMA), através do seu presidente, saiu à rua para convencer os transportadores a voltarem a exercer suas actividades sem receio, alegadamente porque havia polícia para controlar a situação. No entanto, poucos “chapeiros” acataram o apelo.
Abordada pela nossa reportagem, a UNICOTRAMA, através do seu vice-presidente, António Manjate, reconheceu o problema de encurtamento e garantiu que a associação irá conseguir combater.
Segundo Manjate, a UNICOTRAMA introduziu uma nova estratégia que consiste na disponibilização de uma linha verde e panfletos apelando à denúncia, pelos utentes, de quaisquer casos de desvio e encurtamento de rotas.
Tarifa é para manter
Por sua vez o município de Maputo convocou uma conferência de Imprensa no final da tarde onde através do Vereador dos Transportes e Comunicações, João Matlombe, garantiu que a tarifa que entrou ontem em vigor é para manter e que a Polícia Municipal vai trabalhar para garantir o fim de encurtamento de rotas. Pediu a colaboração dos munícipes, denunciando os desvios dos transportadores.
Contactada pelo Canalmoz, a porta-voz da Polícia Municipal, Florência Novela, disse ontem que os transportes semi-colectivos de passageiros pararam de circular nas cidades de Maputo e Matola e nalguns pontos, as pessoas saíram à rua para protestar contra a entrada em vigor da nova tarifa.
“As pessoas que conseguiram sair das suas casas nas primeiras horas não tiveram como voltar. Muita gente esteve aglomerada nas paragens. Outras caminharam a pé. Numa das paragens, encontramos um transportador a recolher com medo que lhe queimassem o carro”, disse. (Matias Guente, António Frades e Cláudio Saúte)

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