quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Após caravana pelo Brasil, Delúbio diz ter consciência tranquila


01 de agosto de 2012 07h44 atualizado às 12h17
O ex-tesoureiro do PT chega ao diretório zonal do partido na Vila Mariana, em São Paulo. Foto: Renato S. Cerqueira/Futura PressO ex-tesoureiro do PT chega ao diretório zonal do partido na Vila Mariana, em São Paulo
Foto: Renato S. Cerqueira/Futura Press 
Gustavo Gantois
Direto de Brasília
Delúbio Soares chegou à sede da Central Única dos Trabalhadores no Distrito Federal (CUT-DF), no dia 24 de julho, cerca de 20 minutos após o horário marcado para a sua apresentação. Deu duas voltas no salão, cumprimentou um a um os presentes e se isolou numa sala com acesso liberado apenas aos militantes ilustres da capital. O encontro, promovido pela juventude petista, foi o último de uma série que começou no início do ano passado, com o objetivo central de apresentar a defesa de Delúbio no processo do mensalão. No encerramento de sua caravana pelo País, o ex-tesoureiro do PT disse que a denúncia não prova que houve mensalão e garante que vai "com a consciência tranquila" para o julgamento.
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O discurso não mudou desde 2005, quando o presidente do PTB, Roberto Jefferson, denunciou o suposto esquema de compra de apoio parlamentar ao governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As aparições públicas de Delúbio obedecem a um roteiro que ele costuma seguir à risca. Primeiro, mostra como teve a defesa cerceada: houve depoimentos de testemunhas sem o conhecimento de seus advogados, o que é ilegal; depois, diz não haver provas de que alguém tenha recebido vantagem indevida.
"Se tem alguma irregularidade, não é criminal, é eleitoral. Isso deveria ser uma denúncia pelo Código Eleitoral, e não Penal. Das 394 testemunhas de acusação, nenhuma ouviu falar de compra de votos. A Procuradoria (Geral da República) não conseguiu provar nada da denúncia. Fui convocado a ir quatro vezes à CPI. Fui à Procuradoria, à Polícia Federal 'n' vezes - mais de 50, acho que 66 vezes - responder sobre o processo. Quero explicar que isso não houve, não teve compra de voto nem corrupção de partido", defende-se o ex-tesoureiro do PT, acusado dos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa.
Ato contínuo, Delúbio pede aos presentes que abram um documento de 78 páginas, nas quais destrincha todos os seus argumentos. Nessa parte da apresentação, o ex-tesoureiro recorre à biografia do ex-vice-presidente José Alencar, morto no ano passado, para demonstrar a existência de um entendimento entre o PT e o PL. Esse acordo, fechado ainda antes da campanha de 2002, previa o repasse de dinheiro do PT para pagar as despesas eleitorais não apenas dos petistas, mas de outros partidos.
"As dívidas eram cobradas, e as pessoas não tinham como pagar. Todo mundo foi jogando para o diretório nacional. Perguntamos de quanto era a dívida, e a do PT deu R$ 60 milhões. Fui aos bancos, e todos se dispuseram a emprestar, mas as melhores condições eram do Rural e do BMG. O Marcos Valério colocou suas empresas em exposição, e fizemos um acordo com ele que está bem esclarecido", diz Delúbio.
Segundo a denúncia do Ministério Público, teriam sido desviados mais de R$ 100 milhões dos cofres públicos. Esse dinheiro, que Delúbio insiste em dizer, solitariamente, que era fruto de empréstimos contraídos pelo PT em nome das empresas de Marcos Valério, teria sido repassado a parlamentares em troca de apoio no Congresso.
"Os partidos têm autonomia. Os deputados têm autonomia para votar como quiserem, de acordo com a sua consciência. A própria denúncia não prova que deputado tenha recebido. A palavra mensalão se usou, se usou, se usou... As pessoas teriam que receber pelo menos dois meses. Não tem nenhum parlamentar que tenha recebido mais de uma vez", continua Delúbio.
Na exposição, Delúbio fez até uma diferenciação entre "caixa dois" e "recursos não contabilizados", expressão que ele repetiu reiteradas vezes ao longo da CPI dos Correios, em 2005. "As pessoas foram ao banco, deram seus nomes, retiraram os recursos captados via empréstimos de forma transparente", ele afirma, acrescentando que "isso não é caixa dois, apenas não foi contabilizado nas despesas da campanha".Ao final de sua defesa aos militantes, o ex-tesoureiro pediu que sua mulher, Mônica Valente, falasse algumas palavras à plateia. Membro do diretório nacional do PT, Mônica tem sido uma companheira fiel, segundo amigos de Delúbio, e defensora incansável do marido e do partido.
"Eu sabia que não era um processo contra o Delúbio ou contra mim. Era um processo contra o PT, contra o nosso projeto", disse a mulher de Delúbio, sem explicar a qual projeto se referia.
Sempre receoso com a imprensa, Delúbio não concede entrevistas. Ao final do encontro, o Terra tentou uma aproximação com um dos personagens centrais do mensalão - e o único a assumir sozinho parte da culpa, ainda que atribua outro nome ao que fez. O ex-tesoureiro recusou, mas amealhou meia dúzia de militantes para passar um recado.
"Quero pedir que divulguem a defesa. É isso que temos de fazer. Não vamos ficar nervosos com o que falam de nós. Já falaram tanto de nós. Não é mais uma semana, um mês, que vamos perder a paciência. É um processo político, é uma disputa política. Era o impeachment ou sangrar o presidente Lula para não continuar na Presidência. Nós, do PT, cada um assumiu seu papel. E eu, Delúbio, depois de 12 anos de governo, estou com a consciência tranquila."
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, o ministro Joaquim Barbosa apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.

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