segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Vamos abandonar estereótipos e Unidade Nacional verbal, oca e inconsequente…

Canal de opinião
Por: Noé Nhantumbo
“Concertar”, “tolerar”, “incluir” são verbos de utilização obrigatória em Moçambique
 
Beira (Canalmoz) - Aquele modelo de construção de uma pátria moçambicana em que os moçambicanos eram chamados a unirem-se e a engajarem-se nas diferentes frentes, logo após a proclamação da independência nacional, esgotou a sua utilidade porque ao longo dos tempos, ficou claro que a mobilização política era feita em função de objectivos divisivos em si.
Numa situação em que os altos responsáveis políticos e governamentais constituíam uma ilha separada do resto do país, tanto pelas prerrogativas que detinham como pelos direitos que exerciam, deixaram à vista que as pretensões anunciadas pelos políticos mobilizadores eram diametralmente opostas aos interesses da maioria dos moçambicanos.
A unidade apregoada era como arrebanhar cidadãos e coloca-los ao serviço de uma nomenclatura partidária que se colocava acima de tudo e todos.
Uma governação baseada na imposição e fortalecida pelo controlo policial dos cidadãos não deixava espaço para a manifestação livre dos cidadãos nem a colocação de seus pontos de vista em relação aos assuntos nacionais. Os marxistas-leninistas de ontem ou seus representantes não estavam interessados em si numa “unidade nacional”. Esta era unicamente um meio para garantir que seu poder fosse incontestado. Importava obter a obediência dos cidadãos através de esquemas como aquele mas na essência os governantes tinham bem ciente que o controlo e manutenção do poder dependiam de uma mão dura sobre qualquer manifestação de dissidência.
Quem apelava a unidade nacional pretendia dizer deveríamos estar unidos para trabalhar e implementar ou concretizar os planos definidos pelos órgãos do partido-estado. Reclamar e denunciar o que se apresentava de facto como lesivo aos interesses dos cidadãos era considerado uma heresia que poderia punida com penas de prisão ou permanência de tempo indeterminado em campos de reeducação. Vimos muitas experiências do socialismo soviético sendo implementadas no país. Tivemos o nosso “ Gulag”. Niassa e Milange constituíram-se em lugares escolhidos para transferir forçadamente cidadãos que se recusassem a obedecer as orientações partidárias. Os considerados reacionários, contrarrevolucionários tinham destinos sinistros. Era a lei do mais forte, personificada pelas estruturas do partido espalhado por todo o país. Forçavam uma unidade sabiam não ser possível. Condenavam quem se manifestasse contrário a um ordenamento político que não permitia nem admitia que outras forças políticas existissem e muito menos manifestar-se publicamente.
Foi uma tentativa de moldar e controlar mentes de cidadãos que começou a falhar logo que seus mentores a quiseram colocar em prática.
A Unidade Nacional não se inventa nem se impõe. Tem de haver critérios e razões para as pessoas se sentirem unidas e pertencentes a um projecto comum. Quando mesmo durante a luta armada de libertação nacional se manifestaram tendências de actriz étnico tribal e ficou claro que a liderança não soube encontrar uma forma consensual de lidar com o assunto, a adopção de fórmulas simplistas como “abaixo o tribalismo”, “abaixo o racismo”, “ abaixo o regionalismo” não se traduziram de imediato em solução de inquietações que diferentes pessoas sentiam quando a forma de condução de uma agenda que os governantes denominavam de nacional.
Tem havido dificuldade em trazer fundamentos visíveis de que uma agenda nacional esteja sendo implementada. As diversas tentativas de contrariar que se está em presença de uma agenda promovendo desenvolvimento assimétrico, em que umas regiões aparecem favorecidas e certos estratos populacionais beneficiam-se de facilidades no acesso a fontes de riqueza desvirtua uma propaganda perene. Quando existem possibilidades de oferecer bolsas de estudo para o exterior há esquemas estabelecidos entre os funcionários dos ministérios sediados na capital do país para que seus filhos e aparentados recebam as mais apetecíveis. Para os outros estão reservados destinos como a China e Índia, Argélia ou Líbia. Para o serviço militar obrigatório são encaminhados maioritariamente os filhos dos negros moçambicanos. Outras etnias e raças também moçambicanas praticamente não têm nenhum dos seus filhos nas fileiras das FADM e da PRM. É notória a ausência de médicos ou outro tipo de profissionais de certas etnias ou raças pelos distritos do país. Para uns o destino quase sempre é a capital do país e certas capitais provinciais. Este tratamento desigual parece enquadrado numa estratégia previamente definida visando determinados ganhos de natureza política e económica.
É visível que a maioria dos moçambicanos encontra-se colocada a “leste” dos desenvolvimentos económicos que ocorrem em seu próprio país.
Há preferências de estabelecimento de joint-ventures entre os nacionais que possuem alguma robustez financeira, terra e fábricas com entidades empresariais estrangeiras. Há receios infundados de integração de outros moçambicanos em projectos de natureza económica. Uma desconfiança activa entre moçambicanos impede-os que cooperem e utilizem seus recursos naturais de modo efectivo e que os beneficie.
Há razões mais do que suficientes para duvidar de uma “Unidade Nacional” que só beneficia uma meia dúzia de pessoas e na qual a grande maioria aparece útil na hora de votar em mais pleito eleitoral. “Ludibriar incautos” parece ser a filosofia dos apologistas desta Unidade pueril, ilusória e estranguladora das aspirações dos moçambicanos.
Gastam-se muitos recursos e tempo investindo em assuntos de natureza duvidosa, contraproducentes do ponto de vista daquelas agendas que deveriam estar sendo implementadas tanto como governantes como as forças políticas.
Nenhuma avalanche política ou ofensiva política visando catapultar a Unidade Nacional para o topo da agenda nacional terá significado enquanto questões básicas, relevantes para os moçambicanos continuarem a ser ignoradas.
Teatralização de aspirações políticas de um determinado segmento, organização de showmícios ou outro tipo de manifestação político-cultural pode parecer a forma acertada de lidar com a questão da Unidade Nacional mas seus benefícios são tangentes e mínimos. O avanço do país e a conjugação dos diferentes interesses tem de ser inscrita na agenda dos políticos.
Algumas iniciativas de “acção afirmativa”, limitação do acesso de uns em razão de quotas pré-estabelecidas visando responder a assimetrias histórico-políticas podem resolver pontualmente alguns casos mas jamais serão a resposta abrangente aos problemas que o país enfrenta.
Mesmo a nomeação para postos governamentais, obedecendo a um sistema que se pode designar de quotas étnicas e raciais, não responde aos desafios do presente.
Os moçambicanos clamam por uma convivência sem suspeitas de embustes estratégicos.
Visibilidade, transparência, inclusão, partilha efectiva do que é de todos valem muito mais do qualquer slogan que os políticos inventem, criem ou recriem…
(Noé Nhantumbo)

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