terça-feira, 23 de outubro de 2012

“O Síndroma de Alladin ou Os Novos Assimilados” (Subsídios para discussão)

 

by Mablinga Shikhani on Tuesday, 23 October 2012 at 10:07 ·
Reconheço-me viciado, maníaco mesmo por banda desenhada e literatura clàssica diversa e afim. Na minha infância era “doente” na gíria da minha cidade de criação, muito doente mesmo. Huckleberry Flinn, Athos, Porthos, Aramis, D'Artagnan, Kalaar, Tarzan, Jane, Mandrake, Lothar, Fantasma, Rip Kirby, Sansão & Dalila, Bob Morane, Selimão, Corto Maltese, Rasputin, Morgana, Príncipe Valente, Jean Valjean, Rei Salomão, Kit Carson, Zapata, Ric Hochet, Homem Aranha, Homem de Ferro, milhentas personagens, paladinas da eterna e existencial luta do Bem contra o Mal povoaram o meu imaginârio infanto-juvenil, pese embora as manobras soviéticas e MaArthistas dos meus pais, onde paradoxalmente a minha mãe corporizava MaCarthy, Trotsky e Djezersnky. Perseuia todas as expressões literárias com a mesma força cm que e as adorava, lia e idolatrava.

Para a senhora minha mãe na sua mente, imaginário e percepção, aquelas figuras presentando pessoas, para mim eram personagens, armadas com pistolas, trabucos, mosquetes, espadas, sabres e mesmo a punhos nús, feriam, matavam outros, era a encarnação do Mal. Não Matarás!!! Pensava, e ficava, agora entendo, escandalizada, aliás horrorizada com a adoração que o filho tinha para com tais figuras e literatura e antevia o efeito nefasto que a adoração faria ao seu filho no futuro: bandido, ladrão.

Dos personagens arrolados, Alladin, o menino pobre e órfão figura central num dos principais contos das Mil e Uma Noites, me fascinava particularmente pela proximidade da idade. Não me apercebia que Alladin era de longe mais velho que eu e que como muitos personagens da literatura a sua idade é estática? Imutável? Não era possível, visto que lia, hipnotizado confesso, qualquer obra que me passasse pelas mãos, já disse antes que era "doente"?

Algumas décadas depois, a doença mantem-se, embora concorra com outras actividades e responsabilidades inerentes a um pai, profissional e pessoa parte de uma grupo, sociedade que se rege por um conjunto de normas, deveres e hábitos que a leitura não pode assegurar por si.

Fora os elementos acima descritos Alladin me fascinava mais pelo seu tapete, o "tapete voador", inebriado no feitiço descritivo das obras imaginei-me inúmeras vezes montado (?), sentado é talvez o mais apropriado, viajando para os quatro cantos do mundo e antípodas, Muralhas do Zimbabwe, Sidney, Amazónia, Paris, Versalhes, Cairuão, Egoli, Lubumbashi, Axum, Méroe, ver os Númidas banhando-se na nascente do Nilo... fechando o círculo hexagonal dos espaços temporais e geográficos de todos livros que li.... A Volta ao Mundo em 80 dias? ou o Vagabundo das Estrelas? Seria interessante ver um personagem negro em obras clássicas, estaria eu a rescrever os clássicos e pondo o negro no seu centro? Quem sabe? Mesmo como plágio a ideia me arrepiava de orgulho.

Na perspectiva da Eugenia/Ascensão Social gostaria de trazer o meu personagem de eleição neste escrito. Alladin e os seu gadget o Tapete. Tenho reparado que afinal de contas não era o único adorador de Alladin, bem longe de mim tal presunção. Surpreendo me porém pela degeneração quer da personalidade do herói e do seu gadget e das nefastas consequências de tal desvio e descomando do propósito do escriba e narrador dos contos que povoaram o meu imaginário infanto-juvenil.

O Alladin actual é um menino, bem pelo menos foi, pobre ou muito próximo disso que com bastante sacrifício, ou por via de artimanhas, porque não? Alladin as tinha de sobra. Conseguia subir na escala social até atingir patamares onde por razões diversas a sua origem entram em conflito Caímico com o seu novo Eu. A partir daqui este novo Alladin entra numa nova dinâmica, não dispensa o gadget/tapete, exibe, pelos menos fenotipicamente, as suas modestas e parcas origens, mas com novos propósitos.

Este novo Alladin, tem de facto um tapete, mas não voa, ou pelo menos não o vemos voar como vimos nas versões ilustradas e em filmes dos contos das Mil e Uma Noites, mas o tapete voa e o novo Alladin também e como...

O tapete do novo Alladin é o diplomado, se de nível superior melhor. Este tapete fá-lo sentir uma pessoa diferente, não na perspectiva de, de alguma forma estar mais equipada para ajudar a resolver os problemas que muitas pessoas, o seu povo enfrenta e atravessa, continuando o papel tradicional e clássico do herói Alladin que combate o Mal nas suas diversas formas e expressões. Não. Ele se transforma num anti-herói, na encarnação viva e presente do seu alter-ego Caim, na nêmesis mais obscura do menino pobre e humilde que originalmente nasceu.

O tapete deste novo Alladin/Caim, o Diploma é usado para se sobrepor aos demais, transformando esta pessoa numa espécie de super ser, de uma nova nobreza, porque por motivos e experiência histórica, burguesia não é de certeza. Explora, rouba, denigre, age de má-fé escudado neste tapete/escudo que é o diploma. As pessoas normais, comuns-mortais são obrigadas a reverenciar, idolatrar e respeitar este novo Alladin, o supra-sumo, o oposto da Razão comum, pois ele é a razão, sua origem, instrumento e fim.

Em muitas esferas é bastante visível esta nova classe de gente, sem nenhum papel heróico de certeza, representa sim o oposto das ânsias, expectativas e sonhos dos pais e família, ou será o contrário? Os nossos Alladins apresentam-se, assim, como uma espécie de inimigos do seu próprio povo, de onde provêm e a quem devem servir. Privatizam os problemas, tiram proveito pessoal das soluções que deveriam oferecer, sobem o povo que deveriam servir... estes não são nenhuns Alladins, mas sim a sua pior nemêsis, padecem do perigoso Sindroma de Alladim.

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