quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Monopolizar a opinião política constitui-se em forma de dominação

Canal de Opinião
Por: Noé Nhantumbro
 
… Não escutar a intelectualidade nacional e a comunicação social crítica pode ser fatal…
Beira (Canalmoz) - O que se pode verificar ao nível da expressão política em Moçambique revela que quase toda a produção de cariz intelectual provém de Maputo, a capital do país.
Estando o centro do poder político e governamental aí instalado, torna-se deveras fácil um importante segmento da intelectualidade moçambicana e fazedores de opinião, expressarem-se de maneira incisiva em defesa de seus pontos de vista. Amiúde ocorre que esses posicionamentos em linha de convergência com as expressões do poder político vigente, acabam tendo grande influência na opinião pública nacional e internacional. O “Evangelho segundo Maputo” conta-nos uma história dos que se querem colocar como vencedores no processo histórico recente do país e através de uma confraria estabelecida na comunicação social pública, na academia pública e mesmo privada, conseguem fazer passar uma mensagem subliminar de primazia e de possessão da verdade política e científica neste país.
Uma observação dos diferentes processos políticos desde a descentralização governativa aos processos eleitorais mostra que no resto do país praticamente só se consome o que da capital do país é produzido do ponto de vista informativo e intelectual.
Não se pode negar a posição geopolítica estratégica da capital de um país entanto que centro do poder, de onde emanam as grandes directivas que sustentam a governação. O que se pode e se deve questionar é a existência de outros centros de pensamento político neste país que se quer democrático e realmente participado.
O protagonismo e a capacidade de cada um manifestar seus pontos de vista deve ser desenvolvido e promovido como forma única de estabelecimento de uma democracia política em que todos se revejam como cidadãos de igual estatura e direitos. Quem não está na capital também é moçambicano de pleno direito.
Estabelecida a necessidade de participação multiforme dos moçambicanos na construção de seu país o importante é descobrir formas de participação convincentes e a altura dos desafios do presente.
Os moçambicanos em certa medida estão cansados dos comentaristas ao serviço de algumas estações televisivas que enchem os ecrãs semanalmente, produzindo opinião sobre os mais variados assuntos. É estranho que mesmo possuindo centros de produção em algumas capitais provinciais não se vejam os canais televisivos promovendo debates de interesse regional e nacional a partir desses lugares. Existe uma concentração excessiva de quadros com capacidade de liderar processos de mudança na capital do país.
A exposição privilegiada que é dada aos membros do establishment, à nomenclatura dirigente do governo e as suas participações empresariais ofuscam tudo e todos. Sempre que se tenha que conhecer o estado da economia nacional, a participação do empresariado nacional, o que nos mostram são os mesmos que aglutinados nos fóruns pró-regime. Agora que está na moda a criação de câmaras de comércio as ondas vão na mesma direcção e os constituintes são aquelas figuras que já povoam o ambiente económico e empresarial.
Sem uma compreensão clara e objectiva de que os mecanismos associados à comunicação social estão sendo utilizados para que determinado partido marque pontos com vista a obter uma posição cimeira na hora dos pleitos eleitorais cai-se no abismo das derrotas eleitorais antecipadas. Alguma da fraude legitimamente reclamada pelos opositores constrói-se no dia-a-dia através de apresentação falseada de factos do presente e do passado.
Aquilo que os mentores do actual sistema de governo de Moçambique advogam e praticam é transmitido aos cidadãos em geral através de intelectuais reconhecidamente ao serviço do regime e de pessoas influentes na comunicação social.
Falta da parte da academia e dos altos escalões da comunicação social pública e mesmo alguma privada, uma concertação activa e posicionamentos que contribuam para a promoção de um desenvolvimento endógeno significativo que ultrapasse a beleza das estatísticas oficiais.
O desenvolvimento pode se resumir a uma questão de informação e neste sentido o que falta em Moçambique é aquela informação convenientemente escamoteada aos cidadãos de modo a que possam tomar decisões de voto e outras conscientes do que está em jogo e quais são os jogadores com melhor capacidade de executar os programas propostos.
O povo moçambicano precisa de saber o que está acontecendo com os diferentes dossiers relacionados tanto com o Orçamento do Estado como tudo aquilo que diga respeito ao bem público e aos recursos naturais. Não se pode negociar em nome dos moçambicanos e depois recusar-se a explicar os contornos do negócio como se verifica no caso da reversão da Hidroeléctrica de Cahora Bassa. Dizem-nos que ela é nossa mas recusam-se a dizer quanto pagaram aos consultores e como foi configurada toda a máquina negociadora, quanto custou aos cofres do estado pagar aos lobistas e outros intervenientes no processo.
Se houve alguma abertura, de saudar, no caso de venda das acções da COVE a num consórcio que pesquisa gás natural em Cabo Delgado isso deve se tornar norma escrupulosamente seguida. O que é público deve ser estritamente tratado como público e não ficar nas mãos de “sanguessugas profissionais”.
O que oportunamente tem sido levado a conhecimento público por entidades como o IESE e o CIP dois dos principais “think-tanks” nacionais só para citar estes, deve ser entendido como contribuição positiva da sociedade civil e dos intelectuais nacionais para o desenvolvimento desejado por todos.
Não se pode afrontar e antagonizar a intelectualidade nacional e as publicações ou estações televisivas quando se apresentam críticas em relação a determinado dossier. Isso deve antes ser visto como uma contribuição para correcção ou adopção de posicionamentos diferentes e mais produtivos.
Uma monopolização da opinião política no país tem servido uma agenda visando promover uma governação pouco transparente. Não tem de ser o Parlamento a exigir prestação de contas mas o executivo a dirigir-se voluntariamente ao Parlamento e a esclarecer de maneira profunda seus passos e decisões nos diversos aspectos da governação. A comunicação social tem a obrigação deontológica de perseguir todos os assuntos que dizem respeito a administração pública e prestar informação de qualidade aos cidadãos de tal modo não restem nem desenvolvam dúvidas ou suspeitas quanto a utilização dos recursos públicos em Moçambique.
Uma ofensiva de denúncia dos atropelos ao legalmente estabelecido no país, com vigor e qualidade vai trazer subsídios ao próprio governo e aproximá-lo dos cidadãos.
Há necessidade de novos entendimentos e estratégias no tratamento dos assuntos nacionais pois os pretensos ou supostos segredos apresentados com frequência por alguns ministros não têm base legal nem fundamentos. Quem se apresenta arrogantemente ao Parlamento, recusando-se a responder a perguntas legítimas e pertinentes, assumindo-se como ministro todo-poderoso porque está a frente de um pelouro como o da energia, deveria recordar-se que não passa de servidor público principescamente pago por todos nós, os cidadãos. Comportamentos eticamente questionáveis e censuráveis devem merecer uma moção de censura parlamentar e esse tipo de procedimento não pode ser tolerado.
Quem monopoliza pode até entender que está cultivando vantagens mas se o país se encontra estagnado ou se está construindo paulatinamente um ambiente de instabilidade, as vantagens tornam-se rapidamente em desvantagens e potenciais fontes de graves problemas.
Não se pode permitir que a situação moçambicana evolua para níveis insustentáveis de instabilidade só porque alguns estrategas políticos decidiram enveredar por caminhos escusos, de facilitação de estratégias alegadamente de “empoderamento económico negro”.
Sem uma compreensão urgente da necessidade de paradigmas estratégicos que correspondam a situação actual do país e do mundo as consequências só poderão ser nefastas.
Assumir que a monopolização da opinião política no país serve propósitos contra a democracia deve significar estender o exercício da opinião política para todo o país de tal modo que a as assimetrias sejam efectivamente combatidas e contrariadas… (Noé Nhantumbo)

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