Ministro das Obras Públicas e Habitação e o nome da ponte sobre o rio Zambeze
Felício Zacarias explica em entrevista ao “O País” que à ponte sobre o rio Zambeze foi atribuído o nome Armando Guebuza na ausência do Presidente e que a decisão é irreversível
O período de 2005 a 2008 evidenciou-se por uma grande expansão dos programas de investimentos públicos com a expansão das redes de estradas, pontes, escolas e hospitais. Quais as linhas de força que nortearam esses investimentos?
O programa quinquenal do governo (PQG) é que determinou as linhas orientadoras no sector de águas, estradas e habitação. No sector das águas rurais, tínhamos uma taxa de 40% em 2004 e propusemo-nos a subir para 55%. no da água urbana, tínhamos uma taxa de 36% e propusemo-nos a subir até 60%. No sector de estradas, o objectivo era fazer a manutenção da EN1. Realizámos a manutenção das várias estradas do país com vista a melhorar a transitabilidade. Tínhamos em vista a construção de algumas pontes como as do Rovuma, Lugela e Zambeze. Na habitação, descentralizámos as operações para o nível das províncias e dos distritos. Estas eram as linhas de força neste mandato.
Os agricultores queixam-se da falta de infra-estruturas para colocarem os seus produtos, e os comerciantes idem. O turismo queixa-se de facilidades de acesso. Há um alinhamento estratégico para estas preocupações quando se projectam e executam as infra-estruturas públicas?
Trabalhamos em coordenação com os ministérios do Turismo, dos Recursos Minerais, da Agricultura, e em conjunto olhamos para os sítios onde devemos chegar, em termos de escoamento de produtos e mesmo para o acesso às estâncias turísticas.
Coloco-lhe esta questão porque a principal fonte de financiamento dos programas de expansão de infra-estruturas no país são os doadores internacionais. Até que ponto o Governo tem autonomia de decisão na determinação das prioridades dos programas de expansão de infra-estruturas?
A prioridade é sempre definida pelo Governo. os nossos parceiros financiam os projectos que o governo apresenta como prioridade. Pode demorar, porque eles têm alguns requisitos e algumas exigências, mas no fundo financiam aquilo que o governo determina como prioridade.
ESTRADAS
No seu balanço, o governo refere-se à reabilitação e manutenção de estradas. Por exemplo, diz que reabilitou 3.014Km de estradas durante o mandato, sendo 1.294km de estradas nacionais e 1.721Km de estradas regionais, mas nunca se refere à construção de novas estradas. Porquê? Não estão a ser construídas novas estradas?
Estamos a construir estradas novas. podemos olhar para troços como Samana-Caloma e a estrada entre Montepuez e Lichinga, que não existia. Há estradas que construímos neste mandato. Podemos falar do troço Inchope-Gorongosa, que não existia, e falamos também de pontes que não existiam.
Entre reabilitação e a construção de novas estradas, o que foi prioritário?
Consideramos que primeiro era necessário repor a rede de estradas que existia e continuamos a manter isso como prioridade. Primeiro, reabilitar, depois, construir, e estamos apostados nisso. Temos, por exemplo, o troço Nampula-Cuamba. No tocante às estradas nacionais, essencialmente é a N1.
O último troço em falta era Xai-Xai - Chissibuca, cuja pedra foi recentemente lançada. Como estão as obras?
Numa primeira fase, programámos fazer os troços Maputo-Marracuene, Boane-Chicumbuane, Chissibuca-Massinga, Pambara-Nhachengue. estes são alguns exemplos, o que estava previsto para a primeira fase foi feito. Agora, passamos para a segunda fase, em que estavam programados os troços Xai-Xai - Chissibuca, Massinga-Nhachengue e, brevemente, Jardim-Benfica. estamos a estudar as alternativas a esta via, enquanto o troço estiver em reabilitação.
Quando é que teremos a EN1 totalmente transitável?
Tivemos, este ano, alguns constrangimentos de ordem financeira, mas prevemos que até 2011/12 podemos sair do Rovuma ao Maputo por estrada asfaltada.
Estrada Maputo a Rovuma asfaltada até 2011/2012
Referiu-se a algumas estradas não reabilitadas. Porquê?
O constrangimento fundamental é financeiro, mas algumas dessas obras a que se referiu já estão em andamento, por exemplo, a de Changara é muito provável que até Dezembro esteja concluída. Outras estradas que mencionou, as obras arrancam antes do fim deste mandato. No troço de Montepuez, o concurso será lançado em breve.
Qual é o ponto de situação do projecto de estrada para Ponta D´Ouro?
Lançámos um concurso em que participaram 14 candidatos para a concessão desta estrada. Quatro já foram pré-seleccionados. Agora, aguardamos pelas propostas dos concorrentes. incluindo a estrada e a ponte, a obra está avaliada em 250 milhões de dólares.
Qual é o modelo do negócio?
As acções serão definidas no momento do negócio.
Em modelo de concessão?
Sim. uma das propostas que tive oportunidade de ver é de 20 anos, com uma portagem.
Os privados a que se referiu são estrangeiros ou nacionais?
São nacionais em parceria com estrangeiros.
PORTAGEM NA EN1
Segundo o balanço do meio termo do PQG no âmbito do programa de manutenção da rede nacional de estradas, foi assegurada a transitabilidade numa percentagem de 70% até 2007 e a meta prevista para 2010 será de 73% do total de estradas do país. Será possível alcançar esta meta até ao ano de 2010?
Estamos a trabalhar não só na EN1, mas também noutras estradas. No troço Maputo - Xai-Xai, depois de passar Nhachengua, até chegar em Massinga, na EN1, e a posterior na estrada Vanduzi-Changara. Tete-Chemana até Samana-Caloma, vamos concessioná-las e vamos colocar portagens.
Quantas portagens estão previstas?
Não posso avançar, porque implica aspectos técnicos.
Mas será mais de uma?
Sim. só no troço Maputo - Xai-Xai estão previstas duas.
Quanto é que se gastou?
Cerca de 1 bilião, só em estradas.
De acordo com dados da ANE, o grosso de estradas do país não é asfaltado, beneficiando de manutenção como uma medida provisória para resolver o problema de transitabilidade durante um determinado período. Isso não é um ciclo oneroso, uma vez que a mesma estrada volta a ficar degradada na época chuvosa?
Em certa medida, tem razão. odesejo de ver as estradas asfaltadas existe, mas o problema são os recursos financeiros. E depois tem a questão de como manter essas estradas. Porque não temos recursos neste momento, estamos a ir por fases, de acordo com as prioridades. Primeiro, a rede nacional, depois, temos de asfaltar as estradas que ligam as capitais provinciais e, a seguir, as capitais distritais e as zonas produtivas.
Pontes
Ao longo deste período, foram construídas e/ou reabilitados 1.340 metros de pontes. Trata-se das pontes Moamba-Sábie (província de Maputo), Chókwè-Guijá (Gaza), Mocuba-Lugela (Zambézia), Meluli, em Nampula, e a Rainha Axiwandjira, na província nortenha de Niassa...
em Cabo Delgado estamos a terminar a construção da ponte sobre o rio Rovuma. em Niassa construímos as pontes de Luambala e Cheringo. Na Zambézia, construímos a ponte sobre o rio Lugela. em Nampula, reabilitámos a ponte do Lúrio e da Ilha de Moçambique. em Chiguara e Caia acabámos de construir a ponte sobre o rio Zambeze. construímos a ponte de Guijá, que liga Chókwè a Guijá. Estamos a construir também em Manica.
Do ponto de vista de investi mento...
Foram valores muito altos.
Ponte sobre o Rio Zambeze
Liga os distritos de Caia e Chimuara, nas províncias de Sofala e Zambézia, cuja inauguração está agendada para 1 de Agosto. Está tudo a postos para a sua inauguração nessa data?
Estamos a terminar os acabamentos e no dia 1 de Agosto vamos lá inaugurar.
Em relação à portagem da ponte, estará em funcionamento quando se for inaugurar a ponte?
Estará a funcionar, e o primeiro cidadão a pagar será sua excelência o Presidente da República, quando for lá fazer a inauguração. Estamos decididos, não há mais contemplações, todos temos de pagar.
Qual será o modelo de gestão destas portagens?
Numa primeira fase, vamos assumir as responsabilidades. vamos nós mesmos cobrar, mas no futuro queremos concessionar tudo ao sector privado.
Uma questão que tem suscitado polémica é o nome atribuído à ponte. É verdade que a ponte se vai chamar Armando Emílio Guebuza?
é verdade que vai se chamar Armando Emílio Guebuza.
Quem propôs o nome e quais foram os argumentos que sustentaram esta decisão?
O governo olhou para o desempenho que sua Excelência o Presidente da República teve ao longo do mandato em termos de dinamismo e entrega no sector de construções. ele deu grande ênfase não só ao sector de pontes, mas também de estradas, e particularmente a esta ponte. O pacote financeiro foi fechado neste mandato, sob orientação do PR. Achamos que devia atribuir-se à ponte o nome do presidente.
E o ministro não colocou grande empenhamento nesta ponte?
Coloquei, mas não podemos fazer comparações. Presidente é presidente.
E a ponte não se poderia chamar Felício Zacarias, já que foi um grande dinamizador na construção da mesma?
Eu vou usar uma linguagem popular para responder a esta pergunta: “cada macaco no seu galho”.
Quando foi tomada esta decisão, o PR esteve presente?
Não.
Ele aceitou esta proposta?
Há decisões colectivas às quais o Presidente tem de se sujeitar.
Muitas decisões do Conselho de Ministros são comunicadas em briefings pelo porta-voz, no mesmo dia, e também em comunicado escrito. Por que não aconteceu neste caso, tendo sido o ministro Felício Zacarias a fazer o anúncio em Sofala?
Foi o ministro das Obras Públicas, porque existe um decreto que lhe atribui competências para a atribuição de nomes a barragens, pontes estradas. por isso, foi o ministro da Obras Públicas que anunciou o nome.
A questão que coloco é: se foi o Conselho de Ministros a tomar esta decisão, por que não foi o porta-voz a anunciar?
Não há problema, porque a competência é do ministro das Obras Públicas.
Foram equacionadas outras propostas?
Não.
Várias pessoas dizem que se sentiriam mais confortáveis com nomes como “Ponte da Unidade Nacional”, “Ponte Eduardo Mondlane”. Sendo Eduardo Mondlane o arquitecto da Unidade Nacional e sendo este o Ano Eduardo Mondlane, por decisão do próprio governo, não seria esta a melhor forma de homenageá-lo?
São opiniões que a gente vai ouvindo: ponte Eduardo Mondlane, Ponte da Unidade Nacional...
E não foram equacionadas outras pontes?
Não, em momento algum foi equacionada outra hipótese.
Chamar-se esta ponte Eduardo Mondlane ou Ponte da Unidade Nacional incomodava o ministro?
São suposições, o facto é que a ponte se chama Armando Emílio Guebuza.
O ministro sente-se desconfortável com este nome?
Claro que me sinto confortável, há tantas coisas aqui: Centro de Conferências Joaquim Chissano, escolas com nomes dos nossos heróis. Penso que devemos deixar referências à nossa juventude sobre aqueles cidadãos que deram o seu contributo a este país. Por que não podemos ser referências? Não podemos estar à procura de refúgios. por que é que devia ser este ou aquele? É preciso que as futuras gerações tenham referências, saber que houve um chefe de Estado chamado Armando Emílio Guebuza.
Esta decisão é irreversível?
A decisão está tomada, e tenho pena. as pessoas podem continuar a murmurar por aí, mas a decisão está tomada.
Ponte Samora Machel, na província central deTete
A passagem pela ponte Samora Machel, que dá entrada à cidade de Tete, é feita sob condicionalismos. Quando arrancam as obras da sua reabilitação?
A ponte Samora Machel em Tete está a ser reabilitada pela empresa Teixeira Duarte, e as obras estão a decorrer.
O ministro também anunciou uma nova ponte sobre o Zambeze que vai dar a Tete. Já estão mobilizados os financiamentos para a sua concretização?
Sim. temos como perspectivas, antes do final do mandato, a construção da nova ponte na província de Tete, que vai ficar a jusante da actual ponte. Já recebemos a proposta financeira da Mota Engil e do grupo moçambicano que se propôs a fazer a parceria público-privada com o governo. Caso tudo corra bem, até ao final de Agosto teremos uma resposta, e depois passaremos às negociações. E a credito que as obras da nova ponte vão arrancar ainda este ano e a actual ficará para os peões, carros ligeiros, etc.
Falta clareza na manutenção de estradas
Uma grande mudança operada no sector de estradas foi a alteração da estrutura organizacional e do pessoal nas suas agências, em particular na ANE, com a indicação do novo Conselho de Administração, do director-geral, de quatro directores executivos e dez delegados provinciais. O que ditou estas alterações?
Foi uma tentativa de trazer maior dinamismo ao sector. mas apesar do esforço empreendido, o sector não responde cabalmente aos anseios do ministério no sector.
O que está a falhar?
Falta muita coisa. não temos uma clareza na política de manutenção, o que me deixa preocupado e constrangido. Na província de Manica há manutenção das estradas, mas noutros sítios não se verifica isso.
Os doadores fizeram pressão para que o director-geral da ANE fosse escolhido por concurso público. A escolha recaiu em Eusébio Siquela, mas a meio do caminho foi demitido das suas funções e voltou-se à fórmula de nomeação, com a indicação de Nelson Nunes. O que aconteceu?
Ninguém diz que mudou o regime de concursos. Colocámos o engenheiro Nelson Nunes como director-substituto até que existam condições para que se lance o concurso. E estão a ser seguidos alguns procedimentos (...) A adaptação não tem que ver com o concurso, mas sim com a questão do cumprimento do programa. O Conselho de administração da ANE reuniu-se e por consenso achou que o director-geral, Eusébio Siquela, devia cessar funções. O conselho achou que ele não estava a cumprir e fez a proposta ao ministro.
Ponte sobre o rio Rovuma
Em 2005, foi lançada a primeira pedra da chamada Ponte da Unidade. Por que quatro anos depois ainda não está pronta?
Houve um problema com o empreiteiro, constrangimentos de ordem técnica. o modelo que adoptámos para a construção daquela ponte é similar ao da “Armando Emílio Guebuza”, design and build (desenhar e construir). Sucedeu que o empreiteiro enviou material para cá que não se adequava ao projecto e a substituição desses materiais levou muito tempo. Até que tomámos uma decisão, e as coisas começaram a andar.
E quando estará pronta a ponte?
Entre finais de Outubro a Novembro deste ano estará concluída.
Colocava-se a hipótese de complementar a ponte com estrada, que não havia, pelo menos quando eu lá fui em 2005. Está resolvida essa questão?
Existe um interesse do BAD (Banco de Desenvolvimento Africano), no âmbito da integração regional, de fazer uma estrada do lado da Tanzania, de Mutuara até chegar à ponte, e do lado moçambicano, de Mueda até chegara a Nicomane. Estamos a tratar dos procedimentos.
Reconheço que temos fraquezas no sector de habitação
O sector de habitação parece ser o elo mais fraco do ministério. Parece não haver foco na área; há ausência de política clara e estruturante na área de habitação; de políticas públicas para residências dignas em espaços parcelados e urbanizados com toda a infra-estrutura social à volta...
Reconheço que temos aqui uma fraqueza, e é uma área extremamente sensível, que exige muitos recursos. O que fizemos foi descentralizar todas as acções do fundo de Fomento e habitação para o nível provincial, para o nível dos municípios e distritos. E houve algum dinamismo no sector, porque as coisas estavam centralizadas a nível da capital do país. com este processo, conseguimos estar representados em 36 distritos e 14 municípios; estamos em todas as capitais províncias; marcámos cerca de 5.000 talhões em todo país. achamos que é pouco, mas foi o que pudemos fazer. Conseguimos dar créditos de habitação a duzentos cidadãos; concluímos 200 casas. E a nossa filosofia agora é entregar terra infra-estruturada para as pessoas poderem construir, porque agora estamos a tentar sair do fundo e encontrar outra forma de financiamento.
Há uma ausência clara de uma política de habitação...
O problema é o constrangimento financeiro. diz que não foi feito nada, mas temos espaços nos municípios onde foi feita urbanização básica.
Não está a faltar foco?
Maior parte que vem para o sector de estradas são fundos externos, e na habitação não conseguimos mobilizar fundos.
Os doadores não estão interessados em financiar a habitação?
Há certos passos que teremos que dar, pode ser que daí consigamos ter algum financiamento. já conseguimos fundos para a água, para as estradas, mas para a habitação a coisa não é assim tão simples.
Habitação condigna é um direito constitucional...
Estamos a trabalhar nesse sentido, o que podemos fazer estamos a fazer. promovemos a construção com materiais alternativos para casas evolutivas, de modo a que o cidadão possa construir a sua própria habitação.
PICOCO morreu?
Está a andar, mas temos problemas com alguns empreiteiros, e infelizmente até com empreiteiros moçambicanos que não estão a cumprir com o contrato. E noutras províncias optamos por trabalhar com os artesãos locais, e as obras saem muito mais baratas.
Em que pé está a transformação do FFH em banco?
Estamos a trabalhar nesse sentido. há bancos comerciais que estão interessados em fazer parte deste processo. Não se pode olhar para este banco como comercial, que cobra juros e taxas, este tem mais uma função social.
Apesar da descentralização, a gestão dos condomínios ainda é do MOPH. Porquê?
Enquanto tivermos os problemas que temos com os habitantes dos prédios, que têm problemas de contribuir para a sua própria existência, a comissão vai continuar a existir, porque tem a função de arbitrar os problemas que existem nos condomínios.
O Regulamento do Regime Jurídico dos Condomínios, aprovado em 1999 pelo Conselho de Ministros, com o objectivo de regular as relações entre ocupantes de fracções de um mesmo prédio, após o Estado vender as casa aos inquilinos, permanece “letra morta”. O que está a falhar na sua implementação?
Esse regulamento funcionou para uma determinada fase, e hoje precisa de ser revisto, porque há coisas que não estão previstas, que precisam de ser reguladas. E as medidas serão drásticas quando aprecem vizinhos que prejudicam a maioria com as suas construções. Destruímos uma infra-estrutura no prédio das torres, de alguém que dizia ter costas muito largas. as leis são para cumprir.
Não há necessidade de se rever?
Estamos a trabalhar nesse sentido, mas há algumas prioridades e há coisas que não conseguimos resolver neste mandato e não vamos conseguir, por exemplo, o problema das ruínas.
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