quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Endurecimento de posições é igual a políticas obtusas e incongruentes

Canal de opinião
Por: Noé Nhantumbo
 
Corporações internacionais estão sendo uma das causas…
Beira (Canalmoz) – Os negócios dos recursos minerais em países como Moçambique podem ser olhados sob vários prismas. Quando se atribui importância estratégica a esses recursos minerais entram logo em jogo interesses de diversos actores e cada um procura de maneira activa “puxar a brasa para a sua sardinha”.
De um silêncio inicial quanto a existência potencial de recursos minerais estratégicos para a economia mundial, Moçambique foi como que descoberto pelos principais actores internacionais. E quem se julga ligado aos interesses corporativos julga-se insuflado e protegido. Mas Mobutu também estava e quando chegou a altura de ser considerado uma peça “avariada”, os contratos de exploração dos recursos começaram a ser assinados por Laurent Kabila mesmo antes das suas forças alcançarem Kinshasa…
Mas convém que os moçambicanos abram os olhos e reflictam sobre os assuntos de maneira adulta. Ninguém se preocupou e drenou fundos e recursos para que se alcançasse a paz em Moçambique, só porque os moçambicanos eram “meninos e meninas bonitas”.
Internacionalmente, os principais pesquisadores de minerais sabiam perfeitamente que o Canal de Moçambique e países como a Tanzânia e o Quénia, Moçambique, Sudão e outros estavam situados em bacias importantes e com potencial de possuírem carvão, gás natural, petróleo e outros minerais.
A diplomacia das chancelarias ocidentais envolvidas no processo de pacificação de Moçambique sempre esteve informada sobre o que existia e a importância estratégica das reservas dos diferentes minerais.
A implantação de megaprojectos por um lado traz algum desenvolvimento de infraestruturas, sistemas de comunicação e estabelecimentos habitacionais ou turísticos, algumas receitas para o Cofre do Estado mas existe todo um outro lado que importa estudar e conhecer. Só que todos os esforços empreendidos nessa direcção acabam jogando um papel que se entremeia entre a política e a economia.
O endurecimento de posições políticas em Moçambique, as reclamações relacionadas com os megaprojectos, a arrogância com alguns políticos se manifestam e se apresentam ao público, a relutância em dialogar abertamente e sem subterfúgios, podem em conjunto ser classificadas como o outro lado da moeda. Quando alguns dizem que os recursos minerais podem ser a maldição de um país possuem alguma razão pois isso tem sido o caso com a maioria dos países africanos onde se descobrem e exploram recursos minerais.
Toda a Primavera Árabe é uma amostra inquestionável de como um regime político autocrático, inflexível, procurando por todos meios perpetuar-se no poder toma conta dos recursos naturais de um país e controla toda a estrutura de exploração e exportação. Fortunas incomensuráveis constituíram-se e promoveram a emergência de ditaduras formidáveis baseadas e sustentadas pelo controlo dos recursos minerais de países como a Líbia.
Se um governo pode obter equipamento militar, gás lacrimogéneo, armas, munições, aviões de guerra, helicópteros, fardamentos e tudo o que se refira a logística militar, com base em créditos facilitados e garantidos por recursos minerais, concedidos por países como a China, rapidamente alguns dos integrantes de tal governo, podem começar a pensar e a julgar que são omnipotentes e omnipresentes. A megalomania é um fenómeno de rápida geração e desenvolvimento.
Se os financiamentos para o Orçamento Geral do Estado continuam a fluir a partir das capitais ocidentais e se as avaliações ou apreciações que são dadas ao país continuam a ser de elogios isso pode obscurecer a vista de algumas pessoas ingénuas. É fácil elogiar quem domina reservas de gás natural muito importantes, sobretudo quando tal elogio vem de quem possui uma das maiores companhias mundiais de exploração de gás e petróleo.
Quem se julga poder absoluto dificilmente terá a predisposição de escutar os outros ainda mais numa situação em que os financiamentos fluem e os agentes de créditos internacionais não param de bater a sua porta oferecendo isto e aquilo.
A deslocação de um núcleo da liderança da Renamo juntamente com seu líder, Afonso Dhlakama para as matas da Gorongosa é um sinal preocupante indicativo de que internamente não estão acontecendo aqueles diálogos difusores de tensões e com capacidade e potencial de reunir consensos. Todos os castelos e sonhos construídos com base nos recursos minerais descobertos e explorados em Moçambique podem rapidamente entrar em derrapagem.
Com infelicidade indisfarçável o mês de Outubro, emblemático simbolicamente, pois a 4 de Outubro, há vinte anos atrás o governo da Frelimo e a Renamo assinaram o Acordo de Paz. Terminava assim uma guerra fratricida alimentada por tendências hegemónicas, intolerância política e alguma cegueira política. Algum aparente poderio militar e apoios externos convenceram o governo da altura, de que poderia confrontar-se e ter êxito contra uma guerrilha embrionária. Esta guerrilha evoluiu com apoios multifacetados, desde Bona a Nairobi, passando por Pretória e Lisboa. A guerra civil revelou-se com o prolongamento ou sequela da guerra fria. Seus apoiantes situavam-se todos na esfera de influência ou dos EUA ou da Rússia.
Porque o fim da guerra não foi corolário da emergência de uma atitude e postura de debate e diálogo aberto dos problemas nacionais, a solução de questões importantes, contidas em alguns dos protocolos do Acordo de Roma foram sendo adiadas. Rapidamente se instalou um sistema de governação baseado na rapina do que tivesse algum valor. Os governantes aproveitaram-se das fraquezas institucionais e estabeleceram sistemas de corrupção eficientes que os levaram a acumular riquezas vistosas em muito pouco tempo.
Os cuidados e a atenção que assunto como a promoção da tolerância política, estabelecimento de instituições credíveis para organização dos pleitos eleitorais, a organização de um exército e polícia despartidarizados foram sendo adiados por conveniência de quem exercia o poder em Maputo. Mas assunto não resolvido não morre.
Ninguém em pleno uso de suas faculdades mentais e analíticas poderá afirmar que Afonso Dhlakama reclama sem sentido e razão quando se refere ao dossier militar, FADM e PRM. Foram ou não colocados na reserva grande parte dos oficiais provenientes da guerrilha? Onde está a maioria do oficialato proveniente da Renamo?
Que acções de reintegração social permanente dos ex-guerrilheiros ocorreram e ocorrem?
O discutido e suspeito pacote eleitoral pode e deve ser alterado para acomodar todos os interesses dos partidos ou não? Não é claro e evidente que com a actual Lei Eleitoral, com o STAE e CNE como são e estão o beneficiário é a Frelimo?
No importante sector económico e financeiro o que acontece é que o governo age e actua de maneira deliberadamente suspeita, ao encobrir todos os actos relacionados com a autorização de exploração de recursos minerais em Moçambique. Afinal quem restringe o público de ter conhecimento dos grandes dossiers da economia moçambicana não está de maneira alguma interessado em ver a democracia política e económica singrando no país. Em nome da verdade e da objectividade, alguns dos nossos proeminentes analistas políticos e comentadores televisivos tem de admitir pelo alguma vez que a razão também reside em outros quadrantes.
Há uma plataforma que foi instalada e lubrificada, que funciona em pleno na arena económica. Através do controlo da economia a liderança da Frelimo coloca-se em posição de “ditar regras” na esfera política.
Obviamente que os políticos de outros partidos mesmo que estivessem distraídos tomaram conhecimento da situação vigente no país. Participante no conflito que a opôs ao governo, a Renamo surge como a mais interessada em discutir os pontos que julga estarem a prejudicar seus membros e organização em si.
O governo da Frelimo terá fabricado ou moldado um pacote informativo para consumo público que apresente Afonso Dhlakama como “eterno desestabilizador”.
Mas nem todos os moçambicanos acreditam nas sucessivas montagens apresentadas nos órgãos de comunicação pública e daqueles afectos à Frelimo.
Há provas substanciais de que a Renamo possui alguma razão nas suas reclamações. Se a objectividade é o critério utilizado é obrigatório dar razão onde ela existe. A Deus o que é de Deus e a César o que a este pertence”.
Há que reconhecer e é de extrema importância que os políticos tenham ponderação e o cuidado necessário para abordar e tratar dos problemas do país conforme eles se apresentam. Posições de força ou a exibição da força podem fazer resvalar todos os ganhos recentes no capítulo do desenvolvimento país.
O Parlamento moçambicano é chamado a intervir e a manifestar posições em defesa dos cidadãos e da estabilidade nacional. Os representantes do povo são chamados a revelarem-se como moçambicanos eleitos para salvaguardar e defender os direitos dos moçambicanos. Os “toques subtis” de uma aparente legalidade nos seus actos devem conduzir o governo para o diálogo que se mostra urgente e necessário.
Não é altura de exibirem dotes retóricos ou qualidade verbal de vulto. O mais importante é trabalhar-se no sentido de conciliarem-se posições e respeitarem-se os direitos de todos os moçambicanos.
A macrocefalia actual, a base oligárquica que se estruma nos recursos naturais do país e nas facilidades de saque directo dos cofres do estado, as trafulhices que são toleradas e promovidas, a exclusão dos outros e o arregimentamento de boa parte da comunicação social do país, só servirão para adiar o que será o “Verão Africano” um dia… (Noé Nhantumbo

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