quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Ainda os ecos do Congresso de Pemba

Canal de Opinião
Por: Noé Nhatumbo
 
Fim da linha evidente para uns e um compasso de espera para o funeral de outros camaradas…
Maputo (Canalmoz) - Num procedimento tipicamente como aos prescritos por Maquiavel assistiu-se ao desmoronamento de um castelo político que alguns “camaradas” haviam construído à custa também de muito “jogo de cintura” e das mesmas fórmulas tão bem enunciadas por Nicolau Maquiavel.
Se não é um desmoronamento físico cruel em que os derrotados nem hipótese real tem de defesa, é uma derrota filosófica, ideológica em que transparece que a soma de mentiras ou de embustes ideológicos cumpriu a sua missão na íntegra e que agora chegou ao fim.
Uma simples hipótese de reivindicação de activação de uma comissão de verdade e reconciliação em Moçambique coloca muitos “camaradas em completo pânico”. Porque Samora Machel morreu muitos apresentariam a tese de que agiam cumprindo ordens e instruções directas do líder. Pelo cumprimento muitas vezes indecoros e cobarde manifestado de acusação firme a pessoas que não se podem defender porque já morreram, é de imaginar que alguns dos protagonistas de actos atrozes, se procurariam esconder sob as malhas e teias de uma inocência difícil de explicar e justificar.
Se sobram alguns dos mentores de alguns das posições ideológicas que eram características dos dias do partido único isso deve ser mais por o “comissário chefe” ter entendido e assumido que não representam algum perigo. Também pode ser reflexo de que em algumas pessoas ainda vivas não se mexe sob pena de se incorrer em perigos evitáveis. Mais vale a pena contemporizar com algumas figuras até consideradas caducas dentro do partido, do que hostilizá-las a ponto de as fazer criar tumultos ou outro tipo de manifestação que pode desviar a atenção dos objectivos principais. Parece ser esse o tipo de consideração que terá merecido o antes ou actual “king maker”, Marcelino dos Santos e outros antigos “players” de renome. Uma vez no primeiro CC que permaneça lá desde que não levante ondas. Outros terão até equacionado sua continuação no CC como forma de agradecimento e recompensa de seus préstimos na luta pelo fim da II República de Joaquim Chissano.
Mas convenhamos que é um “histórico” a quem já muito pouca gente escuta. Já não tem aquela pedalada nem aquela pujança que o faziam temido nas hostes da Frelimo. Seu discurso perdeu-se no tempo e suas ideias de marxista e leninista estão enferrujadas e não merecem atenção nem consideração daquele partido sobre o qual ele alegadamente disse, “eu sou a Frelimo”. Fim da linha e fim da história. Enquanto durou foi bom.
Não se pode deixar de congratular um líder político que astuciosamente tem sabido movimentar-se de tal forma que todos cantam e dançam o que ele determina em seu partido.
Para o país uma liderança incontestável num partido é bem-vinda no sentido de que permite a apresentação de sua plataforma de governação de maneira rápida e consequente. Quanto aos méritos que tal significa em relação à proclamada democracia interna é “farinha de outro saco”. O fortalecimento de sua posição através da composição da Comissão Política da Frelimo mostra que teremos um recrudescimento de acções unilaterais e sobre de continuação de uma utilização de fundos do Estado para o financiamento de actividades políticas da Frelimo.
Os membros do partido que se colocaram em posição de “derrotados” ou cujas teses não se viram consideradas durante o Congresso da Frelimo em Pemba, terão em certa medida colocado em risco a concretização de alguns programas inscritos numa visão estratégica em cuja elaboração estiveram presentes.
Ao darem carta branca para agir como presidente de um partido reconhecido como campeão da centralização, os “camaradas” terão oferecido as munições de que AEG precisava para concluir seu projecto. Não tanto o projecto político, mas, sim, um projecto económico-financeiro que não teria ganho tracção sem as posições que foi sucessivamente ocupando na esfera política e governamental.
Se fosse num combate de boxe, diríamos que as alas intelectuais e aquela que se revê na figura de Joaquim Chissano terão “atirado com a toalha ao chão” num típico gesto de desistência.
Com ou sem governo grande uma coisa é clara e evidente em política, quando se dá espaço a certos protagonistas, o poder passa a ser exercido em forma de ditadura mesmo que camuflada.
Penso que ninguém duvida que os novos ingressos na Comissão Política da Frelimo, os governadores provinciais, não tem peso nem estatura para opinar ou contrapor-se a qualquer ideia que provenha dos verdadeiros centros do poder em seu partido.
Sem uma oposição real ou “camaradas” que convidem sem receios para debates internos fundamentais, vai-se ver um partido no poder expressando seu poder através de mais arrogância como os moçambicanos tem tido tristemente a oportunidade de testemunhar.
É bastante improvável que um ministro das Finanças elevado a membro da Comissão Política recue ou coloque obstáculos a utilização indevida de fundos do Estado para fins partidários. Se até aqui não conseguiu transmitir uma mensagem de transparência, de futuro isso será muito mais difícil. Sejamos francos e honestos, pois isso até nem é muito caro. Está montado o palco perfeito para actuação de uma orquestra em que o maestro é bem conhecido e seus integrantes representam qualquer papel que este deseje ou determine.
Mas com ou sem congresso do partido no poder, com a derrota qualificada de todos aqueles que se consideravam reserva moral da Frelimo, Moçambique, como país que abraçou o pluralismo político, não vai recuar e nem os partidos da oposição vão ser ofuscados pelo que se passou em Pemba.
Felizmente para os moçambicanos a tese de um “Reich da Frelimo de 1000 anos” não passou de miragem de seus promotores. Existem partidos da oposição que se assumem e actuam como tal. Obliterar a oposição não se concretizou e arrebanhar partidos situacionistas para reuniões magnas tornou-se a vergonha para quem aceita e aceitou esses convites envenenados.
Aqueles partidos políticos ditos da oposição, mas que se vergaram ao peso e musculatura da actual arquitectura do partido Frelimo, não passam realmente de uma amálgama de interesses organizados e programados, senão emparelhados, por serviços de inteligência afectos ao partido no poder. De outro modo, é extremamente difícil de conceber que um líder de partido da oposição aceitasse encenar e realizar acções de apoio ao partido no poder como já tem sido visto alguns pretensos líderes fazendo em plateia pública.
Este congresso de Pemba que a Frelimo realizou teve o condão de mostrar aos moçambicanos diversas coisas e uma delas terá sido a relevância do “escovismo” e da subserviência para a sobrevivência não política, mas material de pretensos líderes políticos. Derrotados politicamente e sem alternativas válidas no campo político real do país, optam por lamber as botas da liderança política governamental no intuito único de sobreviverem, e gozarem de regalias ou dos restos dos banquetes promovidos amiúde pelas entidades líderes na esfera política e governamental em Moçambique.
Agora a palidez e sossego que alguns “camaradas” receberam ou assistiram a derrocada de sonhos de décadas é facto de estranhar. Será que a força da ala de AEG foi e é tão demolidora que não deu qualquer hipótese para que alguns dos membros da Frelimo, que se consideram campeões da intelectualidade nacional e do verbo, nem falar conseguiram? Ou simplesmente sua importância está de tal forma corroída que não lhes foi permitido falar?
Não se deve rir com a desgraça dos outros, mas há que reconhecer que a vida de alguns ilustres do passado virou a calvário.
O troco que estão recebendo por acções passadas deve pesar na consciência. Espezinhar os outros enquanto se julgavam todo-poderosos era fácil, mas comer o pão que o diabo amassou não deve ser agradável…
“Os homens construirão engenhos com os quais se auto-destruição”… (Noé Nhantumbo)

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