segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Acordo de Paz em Moçambique tinha como horizonte as eleições de 1994 - embaixador italiano

Edmundo Galiza Matos

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Roberto-Vellano-embaixador-italiaOs acordos de paz de 1992, entre o Governo e a Renamo, que acabaram com 16 anos de guerra civil em Moçambique, tiveram como horizonte as eleições multipartidárias de 1994, defendeu o embaixador italiano em Maputo.
Em entrevista à Lusa, Roberto Vellano (na imagem), que, em 1992, era encarregado de negócios de Itália em Moçambique, balizou o processo de paz, assinado há 20 anos, a 04 de outubro, e intermediado pelo seu país, igreja católica moçambicana e Comunidade de Sant'Egídio.
"O horizonte do acordo geral de paz era as eleições que tiveram lugar em 1994. A ideia de fundo de toda a operação era a de que o Governo, por um lado, aceitou certas garantias políticas vitais que a Renamo pediu durante todo o processo, e mesmo depois. E, por outra parte, com essas garantias e com o aceitar a ideia de que o cessar-fogo fosse o acto final e não o princípio do acordo, isso foi o 'trade-off', o mecanismo que permitiu esse processo de sucesso", disse o diplomata.
"Acho que o horizonte final do acordo era as eleições multipartidárias de 1994", insistiu Roberto Vellano, que regressou agora a Moçambique para assumir o cargo de embaixador de Itália.
Nos últimos meses, a Renamo, principal partido da oposição em Moçambique, tem denunciado que o Governo da Frelimo não está a cumprir os acordos de paz, dando como exemplo o que considera a não-integração dos seus antigos militares nas forças armadas do país, entre outros casos.
"Estamos prestes a celebrar o 20.º aniversário (do acordo geral de paz), é porque o acordo funcionou", considerou o diplomata italiano.
Vellano situou num "contexto histórico raro" da vida política italiana a razão para o envolvimento do seu país no esforço de pacificação de Moçambique.
"O contexto foi dominado por dois grandes partidos, a Democracia Cristã e o Partido Comunista Italiano, que tinham relações muito boas com Moçambique, mesmo antes da independência. Havia interesses convergentes entre essas duas grandes forças políticas", recordou.
"No final dos anos 1980, estava claro que a situação em Moçambique era muito difícil, eu diria, era dramática e que nenhuma das partes tinha capacidade de prevalecer sobre a outra. Foi aí que se iniciaram contactos entre as partes, num processo que durou muito tempo", disse Vellano.
Após uma tentativa frustrada de negociações em Nairobi, em 1989, o processo negocial reinicia-se em 1990, quando o Governo e a Renamo encetam contactos com a igreja católica moçambicana, e, depois, com a Comunidade de Sant'Egídio.
"Como disse o então secretário-geral das Nações Unidas Boutros Boutros Ghali, na época foi uma 'fórmula italiana' da mediação desta negociação: havia uma componente do Governo italiano, institucional, havia a componente da Comunidade de Sant'Egídio e da igreja católica moçambicana", defendeu Vellano.
A "fórmula italiana" não se repetiu em mais nenhum processo de paz internacional e a sua intermediação, de sucesso, em Moçambique nem sempre foi bem vista por outros parceiros.
"É verdade que, durante alguns impasses, nos períodos mais difíceis da negociação, surgiram, sobretudo por parte de países da região, Zimbabwe, Quénia e outros, ofertas para mudar o lugar da negociação. Mas temos que lembrar que os parceiros internacionais no processo de paz tiveram um papel importante", acrescentou Roberto Vellano.
O embaixador italiano reconheceu que o palco de Roma para o acordo entre o Governo de Maputo e a Renamo teve "uma consequência positiva em termos de imagem da Itália em Moçambique".
(RM/Lusa)

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