quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A batalha por Moçambique é hoje e não no dia do voto

Canal de opinião
Por: Noé Nhantumbo

A batalha por Moçambique é hoje e não no dia do voto

Conclave corporativo e político alinha e afina estratégias?…

Não há como ignorar os sinais dos tempos nem as suas consequências em tudo o que se refere ao panorama político nacional.
Toda a acção governativa nos últimos anos, tanto na II república de Joaquim Chissano como na actual administração de Armando Guebuza pode ser resumida a um esforço tendente a emissão do maior número possível de licenças para a exploração de recursos naturais por parte de corporações multinacionais. Algumas intervenções em infraestruturas públicas verdadeiramente úteis também misturam de uma maneira ou de outra interesses privados de governantes.
Se tivermos em conta o que a imprensa malawiana o atesta no caso de uma empresa portuguesa actuando no campo da construção civil poucas dúvidas são de que empresas com interesses lucrativos conseguem obras ou empreitadas através de luvas e subornos das entidades locais que autorizam ou assinam os contratos de adjudicação.
É manchete actual que a Mota Engil de Portugal teria ganho várias obras de construção civil no vizinho Malawi, através de depósitos de avultadas somas de dinheiro nas contas do falecido presidente daquele país, Mutharika.
O mesmo não terá acontecido em Moçambique? Quem nos garante que para além do que se considera lobbies normais a mesma empresa que também tem ganho concursos de obras importantes não tenha utilizado os mesmos métodos em Moçambique?
Estratégias empresariais são prerrogativas admissíveis no âmbito da concorrência mas há limites para tudo. A agressividade de muitas empresas portuguesas aparece muitas vezes associada a relações estreitas existentes entre o Partido Socialista e a Frelimo e disso não restam dúvidas. Há como que uma sombra perene de Mário Soares, útil para a implantação de empresas portuguesas em Moçambique e a isso também tendo em conta o factor “Almeida Santos”.
Mas a realidade mostra que os governantes estão imensamente preocupados com dossiers que tragam receitas para os conglomerados a que estão relacionados ou quem tenham estreitas relações. Os nomes conhecidos como accionistas de diversas iniciativas empresariais nacionais especialmente ligadas aos recursos naturais são pertencentes a figuras dos sucessivos governos do país e suas relações familiares.
Com este pano de fundo é evidente que só teremos esforços conjugando-se no sentido de manter um status que os beneficia.
A situação da democratização do país é periclitante e avança ao sabor dos interesses e apetites dos que desenham os programas e projectos de desenvolvimento nacional.
O que se vulgarmente se denomina de governação participativa acaba sendo um logro pois não há participação ou inclusão das forças sociais nos processos de desenho e tomada de decisões relativas a agenda de desenvolvimento nacional.
Amiúde se criam constrangimentos e nós de estrangulamento sempre que parte dos actores nacionais se procuram fazer ouvir. A inclusão em tudo o que se refira a participação da sociedade civil é algo efémera e inconsistente. Quanto aos partidos políticos parlamentares ou extra-parlamentares a sua participação é de considerar insignificante pois com a ditadura de voto governando a tomada de decisões ou deliberações no âmbito parlamentar sufoca tudo e todos que não pertençam ao partido no poder. Mesmo no seio do partido no poder a manifestação de opinião obedece a critérios de obediência e cumprimento rigorosos de instruções prévias.
É de concluir que haverá um alinhamento estratégico entre as empresas multinacionais que possuem interesses firmes no país e o partido governamental que garantiu suas licenças e autorizações de actuação no país.
Compreender as ilações que a actuação corporativa oferece constitui algo muito importante no desenho de qualquer estratégia política e eleitoral.
Numa situação em que o financiamento das campanhas político-eleitorais se faz de modo completamente desregulamentado não é de estranhar que haja forças políticas que se aproveitem dos vazios legais para drenar fundos e recursos para os partidos políticos de sua preferência.
Aquelas iniciativas de “arrebanhamento” de artistas e outros comunicadores sociais e culturais se tornam possíveis porque empresas de telefonia móvel altamente lucrativas colocam à disposição os fundos necessários sem qualquer hesitação. Por um lado há que cumprir com instruções e por outro lado há que garantir acesso preferencial a licenças e autorizações que não se podem conseguir ou obter sem aval governamental dependente do partido que sustenta o governo.
Os agentes do lobby corporativo multinacional estão atentos e em estado de alerta quanto ao que se passa no país e conhecem profundamente os corredores do poder governamental e suas alianças a nível partidário. Ao nível do empresariado nacional quase que o partido no poder tem a tarefa facilitada pois a sua emergência e sustentabilidade depende por completo do grau de alinhamento com as instruções partidárias emanadas do núcleo que dirige o partido Frelimo. Não se ganham concursos públicos de prestação de serviço ou de empreitadas sem que exista uma ligação entre o concorrente e o partido “vermelho”.
Mesmo no que se refere a obtenção de emprego e progressão na carreira profissional os moçambicanos já sabem que convém e é salutar possuir na carteira um cartão vermelho a ser exibido sempre que seja exigido.
Na luta pelo voto, caminho para a conquista do poder político em Moçambique os obstáculos são inúmeros bem como complexos. Há dificuldades de natureza conjuntural e outros enraizados no tecido social e cultural. A realidade económica, os programas de investimento aprovados, a aliança com o grande “tigre asiático” serão factores a ponderar em qualquer análise estratégica que se queira fazer.
Qualquer vitória deve ser perseguida e conseguida com uma margem que não deixe espaço para dúvidas ou para prováveis manobras de quem controla os órgãos eleitorais.
Não há empecilho que não possa ser vencido na esfera política. Com a adopção de estratégias convenientes, visão esclarecida do panorama político  nacional, uma capacidade redobrada de criação de alianças e consensos operacionais é possível trabalhar-se para uma vitória que faça os moçambicanos regozijarem-se pela democracia conquistada e assegurada.
Os tempos próximos a começar por “ontem” são de seriedade e trabalho a todo o vapor de modo a transformar desejos e sonhos em realidade sentida e vivida pelos moçambicanos.
Há que passar uma mensagem as corporações sobre a necessidade de sua integração numa plataforma legal de exploração de recursos naturais em Moçambique, respeitando os princípios da transparência da indústria extractiva e outros códigos de âmbito internacional.
Disseminar informação programática que demonstre que não estamos contra o investimento privado estrangeiro mas sim contra o saque ao desbarato dos recursos naturais do país vai ajudar a dar a entender e assumir que relações aparentemente vantajosas podem transformar-se em factores de rompimento de acordos e licenças de exploração de recursos. Agir proactivamente por parte das multinacionais, tem de significar afastarem-se de modelos que fomentam a corrupção política e financeira no país.
A vitória eleitoral deve estar desassociada de financiamentos corporativos internacionais.
Não queremos ver a VALE ou a RIO TINTO avançando com iniciativas corporativas baptizadas de responsabilidade corporativa quando afinal se trata de formas artificiais de apoio a campanha político-eleitoral do partido governamental.
Queremos e é desejo da maioria dos moçambicanos que a concorrência e competição eleitoral se faça e aconteça sob o signo da lisura, transparência, igualdade de oportunidades e em respeito para com as leis do país. A soberania e os interesses legítimos dos moçambicanos são chamados a estar na linha da frente do processo político em Moçambique. (Noé Nhantumbo)